domingo, 27 de dezembro de 2009

Pensamentos

“Praticar uma arte marcial como simples treino esportivo equivale a cultivar flores num jardim de cimento; não produz flor nem eficácia. Os esportes estão codificados por regulamentos estabelecidos para suprimir o máximo de perigo; é o objetivo do esporte. As artes marciais devem fomentar a audácia, o sangue-frio, a resistência, o golpe de vista, diante dum ataque armado ... dum combate em que se pode perder a vida ... não um título; é o objectivo das artes marciais”. Tadashi Abe (7.º dan de Aikido)


“Uma queda! Um golpe! Não terminam o combate, se a queda for amortecida, se o golpe foi superficial ... porquê considerar-se vencedor por estes fatores? O esporte é generoso em fazer crer no milagre. Se o combate for real ... se a mão segura uma faca ... essa glória será talvez póstuma. Entre a teoria e a prática, entre o esporte e a realidade, pode haver a diferença da vida e da morte”. Tadashi Abe (7.º dan de Aikido)

domingo, 13 de dezembro de 2009

Sokaku Takeda e sua visão sobre o AIki jiujitsu


Segundo informações do Aikido journal e do site www.aikidojournal.com e do site brasileiro www.aizen.org, .....

Em 1929, o Almirante Naval ISAMU TAKESHITA começou a estudar Daito Ryu com Sokaku Takeda Sensei e publicou em uma revista um artigo intitulado “Estórias sobre a bravura de Sokaku Takeda”. Este artigo chamou a atenção do jornal Tokyo Asahi, que mandou o jornalista YOICHI OZAKA a Osaka, em julho de 1930, para entrevistar Takeda Sensei que se encontrava viajando e ensinando naquela ilha do norte. O artigo a seguir foi escrito pelo Sr. Osaka e foi publicado, pela primeira vez, em 17 de Agosto de l930. * * * Há muitos anos atrás, o Daito Ryu Aikijujutsu existia como uma arte marcial secreta do Clã Aizu. Contudo, a partir do Período Meiji, este véu de mistério que escondia a arte, vem sendo levantado, graças aos esforços do Mestre Sokaku Takeda (1859 – 1943), o herdeiro legítimo da escola. O Daito Ryu é considerado a forma mais avançada das artes de defesa pessoal e não encontra o seu igual entre as outras artes marciais tradicionais, como o Kendo e o Judo. Por algum motivo desconhecido, Mestre Takeda, um artista marcial extraordinário, partiu para Hokkaido, renunciando ao Mundo, há cerca de 20 anos atrás. (*) Ele passou a levar a sua vida em completa reclusão, enquanto cultivava suas terras em Shirataki, em Kitami, no interior de Hokkaido. Embora ele tivesse chegado a ter mais de 30.000 estudantes em todo o Japão, o Mestre vivia no isolamento, a fim de evitar problemas mundanos. Levei 7 horas, viajando de trem para o Leste, após fazer o translado em Nayori, próximo à extremidade norte de Hokkaido, para chegar à casa escondida do Mestre, onde ele vivia em retiro, em Shirataki, em Kitami no Kuni. A sua casa tinha dois quartos de 10 tatami, sem portas de correr entre eles. Além destes quartos, havia uma grande sala de 20 tatami, com uma lareira baixa de 5 pés, rodeada por uma borda de madeira negra lustrosa. Embora estivessemos no meio do verão, havia um grande caldeirão pendurado, com duas pinças de ferro de 16 ou 17 polegadas jogadas nele. O quarto me lembrou, de todas as formas, da casa escondida de TSUKAHARA BOKUDEN (Mestre de Esgrima e fundador da Bokuden Ryu / Shinto Ryu) (1489 – 1571) ou daquela de MATAEMON ARAKI (1597? – 1638? ) (outro mestre, fundador da Araki Ryu) . A sua esposa me deu as boas-vindas, dizendo : “Muito obrigado pela sua gentil visita mas o meu marido viajou, no começo de Junho e ainda não voltou”.

“Como ela é despreocupada”, eu pensei. “Se fosse em Tóquio, uma pessoa imediatamente chamaria a polícia para procurá-lo”. “Ah, sim!”, ela acrescentou, “Recebi uma carta dele há três ou quatro dias atrás. Ele me disse que estaria em um lugar chamado Koshimizu, perto de Abashiri. Mas logo estará viajando de novo e não faço idéia de quando ele voltará para casa. Talvez você o encontre em Koshimizu, mas pode ser também que ele já tenha partido. Isto me desanimou um pouco mas acabei decidindo deixar para lá e levar mais 7 horas de trem, descer na estação de Furuoke, quatro pontos antes de Abashiri, lugar famoso por causa de uma prisão. Eu seguiria então por uma trilha, atravessando uma cadeia de montanhas de 2,5 milhas. Era por volta de meia-noite quando finalmente chegamos à cidadezinha de Koshimizu. Chegando a uma estalagem, um velho de 67 ou 68 anos, que parecia um samurai do passado chegou e me perguntou o que eu queria e de onde vinha: Eu lhe apresentei o meu cartão e o segui. Neste momento, eu ouvi alguém atras do “shoji” dizer : “O quê ? Um jornalista? Que aborrecimento! O que é que ele quer com um velho da roça como eu ? Mas não adianta reclamar. Se ele já está aqui, mande-o entrar!” Ele me saudou com as seguintes palavras : “Eu não queria lhe receber porque é um incômodo para mim, mas parece que não há outro jeito!” Ele vestia um quimono axadrezado de verão, com uma faixa ao redor da sua cintura. Qualquer um pensaria que ele não passava de um camponês pobre pela sua aparência. Não parecia Ter a sua idade, que era 72 anos. Parecia mais jovem e muito vigoroso. Era baixo, provavelmente com menos de 5 pés. Descobri, mais tarde, que ele pesava por volta de 100 libras. Mesmo assim, seus olhos me encaravam fixamente, dando a impressão que não se satisfariam senão quando penetrassem as profundezas da minha alma. “O que é que você quer de um velho como eu”, ele perguntou. “Eu gostaria de falar sobre as artes marciais”.

“Se é sobre agricultura que você quer falar, eu sei alguma coisa. Eu posso cultivar sozinho um campo de 2 hectares. Eu posso arrancar raízes de cêrca de 30 árvores grandes. Ah, Ah, Ah...” Mas logo a conversa voltou-se, com naturalidade, para as artes marciais, o assunto preferido de Sokaku Takeda, começando por cada escola e passando a outros tópicos. O Mestre, que gradualmente ficava excitado, à medida em que falava, fez com que o seu melhor estudante (o velho que eu conhecera primeiro) ficasse no meio da sala e o enfrentasse. Parece que este velho era um admirador fanático de Sokaku e vinha estudando com ele há 20 anos. "Uma vez que a nossa conversa está animada, deixe-me mostrar algumas técnicas. Vamos, ataque-me de qualquer direção!” A sua base forte, com os pés ligeiramente afastados, fazia com que ele parecesse realmente grande. O seu olhar era assustador, da forma com que encarava o seu estudante. Logo em seguida, o seu oponente o atacou com toda a força. E acabou no chão, tendo sido arremessado facilmente por Takeda Sensei, cuja grito parecia o som de um trovão. O estudante murmurou : “Eu me rendo!” A técnica fora tão bem executada que me deixou insatisfeito. Assisti a 10 encontros deste tipo, mas as técnicas eram executadas tão rapidamente que eu não conseguia entender como ele conseguia executar os seus arremessos ou imobilizar o seu adversário, ao ponto de ele não poder, sequer, gemer. "Parece combinado, não?" “É, parece”, falei sem pensar. “Você já praticou Yawara (um outro nome do Jujutsu) ? Levante-se!” Eu me levantei.

“Aperte o meu pescoço, com força”. Sou uma pessoa bem grande e o estrangulei com toda a minha força. Ele então me perguntou : “Está pronto?” Assim que ele gritou, minhas mãos, que envolviam o seu pescoço, pareceram se quebrar. Ele então me pediu para segurar o seu braço direito com as minhas duas mãos, empurrar contra seu peito e várias outras coisas. Eu fiz o que ele mandava e sempre era arremessado sem compreender como ele o fazia. Ele imobilizou o meu pescoço e ambos os meus braços com suas pernas, como se estivesse dando um nó. Meus braços pareciam estar quebrados e eu estava completamente sem fôlego. Quando eu olhei para Mestre Takeda do meu ponto privilegiado no chão, ele estava com os braços cruzados no peito e dizia para seu estudante : “Ei, o chá se derramou!” Eu não conseguia acreditar! Logo depois, ele pegou uma lâmina nua e me mostrou vários Kata. A espada zumbia ante meus olhos; próximo ao meu nariz; e ao redor dos meus ombros, com um som sibilante assustador.

"É muito difícil produzir este som sibilante com a espada. Não é possível cortar uma pessoa corretamente sem produzir este som ao movimentar a espada. É muito difícil fazer esta espada cantar”. Aquele velho de 72 anos não parecia cansado. A seguir, ele comentou como o Marquês TSUGUMICHI SAIGO aprendia rapidamente as técnicas e de como ele encontrara e conversara com o General NOGI, em Nasuno (na Prefeitura de Toshigi) e de como ele se divertia quando aquele último se vestia como um fazendeiro. Ele me disse também como o seu estilo de arte marcial era fácil de aprender, o que era o motivo de ele jamais demonstrar em público. Takeda Sensei me contou como o seu pai cauterizava as unhas das suas mãos, como um castigo pela sua dificuldade em aprender as técnicas. Ele me mostrou as cicatrizes dos ferimentos, ainda visíveis após tantos anos. Mesmo quando chegamos às duas da manhã, ele continuava a falar. "Estas técnicas já lhe foram úteis em uma situação real?", eu lhe perguntei, mudando propositalmente de assunto, a fim de extrair dele mais informações. Inicialmente, ele riu e não pareceu querer responder a minha pergunta, mas finalmente ele contou um incidente. De acordo com a sua história, ele foi atacado por 40 ou 50 trabalhadores de uma construção, na Prefeitura de Fukushima, no começo do Período Meiji e matou 08 ou 09 pessoas. (**) “Esta minha técnica é uma perfeita arte de defesa pessoal, na qual você evita ser cortado, espancado ou chutado, ao mesmo tempo em que você não espanca, chuta, nem corta. Quando o ataque vem, você o enfrenta com precisão, usando a força do seu oponente. Desta forma, até mesmo mulheres e crianças podem aprender estas técnicas. Mas eu tenho como regra não ensinar estas técnicas a ninguém, sem antes obter apresentações e referências, porque elas podem ser assustadores, se mal usadas. Parece que existem pessoas ensinando estas técnicas em Tóquio (provavelmente uma referência a Morihei Ueshiba que ensinava em Tóquio, a esta altura) , mas eu penso que você não pode ensinar outras pessoas, se você mesmo não for muito competente na arte”. A conversa parecia não acabar, mesmo quando o dia amanheceu.

* De acordo com RYUICHI MATSUDA, em “HIDEN NIHON JUJUTSU (Escolas Secretas de Jujutsu japonês), quando um estudante de Sokaku, um Superintendente da Polícia da Prefeitura de Akita, foi transferido para Hokkaido, em 1910, ele solicitou autorização a Takeda para ensinar Daito Ryu à polícia daquela ilha do norte. Takeda concordou e o acompanhou até lá (Pg. 196). No começo, Sokaku ministrou seminários nas estações policiais da Área de Asahikawa. No começo do Período Taisho (1912/1925), ele visitou Shirataki, em Kitami, casou-se e se instalou lá.

** Donn Draeger, em seu livro “BUJUTSU E BUDO MODERNOS”, relata este incidente, indicando que ele se deu quando Sokaku tinha 23 anos, em 1881 e dá como local do evento a cidade de Tóquio. O número de mortos é também indicado como tendo sido 12 pessoas (Pg. 139).

Poder estratégico militar


Em 341 a.C., o Estado chinês de Ch'i, em guerra contra o Wei, enviou T'ien Ch'i e Sun Pin contra o General P'ang Chuan, que era inimigo mortal do último.
Sun Pin disse a T'ien Ch'i: "Os soldados inimigos são rudes, destemidos e corajosos, e dão pouco importância a C'hi. O Estado de C'hi tem sido designado de maneira covarde, por isso nosso adversário nos despreza. Vamos transformar essa circunstância a nosso favor. Quem excele na guerra, confia em seu poder estratégico e percebe as vantagens de se conduzir um inimigo para onde quiser. Faça com que nosso exército de C'hi, ao adentrar as fronteiras de Wei, acenda 100.000 fogueiras. Amanhã 50.000, e novamente depois de amanhã acenda 30.000 fogueiras."
P'ang Chuan, passados três dias, disse com grande exaltação: "Agora sei realmente que o exército de C'hi está apavorado. Estão no nosso território a apensa três dias, mas mais da metade dos oficiais e soldados desertaram. Eu sabia que os soldados de C'hi eram covardes." Sendo assim, P'ang Chuan abandonou a infantaria e cobriu o dobro da distância pela qual ele percorreria normalmente em um dia, somente com as unidades ligeiras e de elite, em direção ao local onde se encontrava o exército de C'hi. Sun Pin, estimou que o exército inimigo chegaria na região de Ma-ling ao anoitecer.
A estrada para Ma-ling era estreita e íngrime e suas tropas podiam ser dispostas a fazer emboscada. Chegando lá, tirou uma casca de um tronco de uma grande árvore e nela escreveu: "Sob esta árvore, P'ang Chuan morrerá." Quando ordenou que um poderoso corpo de 10.000 hábeis besteiros esperassem em emboscada em ambos os lados, e os instrui: "Ao anoitecer, quando virdes um fogo, subi e atirai todos juntos." A noite, P'ang Chuan chegou ao local em que se encontrava a árvore, conforme Sun Pin havia previsto, e ao ver o tronco escrito, bateu uma pedra e acendeu uma tocha. Não tinha acabado de ler a mensagem quando cerca de 10.000 besteiros atiraram em massa. O exército de Wei desmoronou-se em caos e desordem coletiva. C'hi aproveitou a confusão e eliminou todo o exército inimigo.
SUN TZU DISSE: "Quem for hábil em movimentar o inimigo, se dispõe em uma configuração a qual cumpre que o inimigo responda. Oferece alguma coisa de que o inimigo precisa se apoderar. Pelo lucro, move-o, com seus fundamentos o espera."
"O guerreiro inteligente emprega o efeito estratégico e não exige muito dos indivíduos. Leva em conta a aptidão de cada homem e não exige perfeição dos sem talentos."
- A Arte Da Guerra
Sun Tzu

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

porque o Aikido



Autor: Stanley Pranin
Todos iniciam a pratica do Aikidô motivados por um propósito específico ou um conjunto de metas. Entre os mais comuns está o desejo de aprender a Defesa Pessoal, ou ficar em forma ou encontrar companhia (amizades). Com o passar do tempo estas metas tomam um sentido diferente conforme as pessoas começam a experienciar os efeitos transformadores que o Aikidô tem na vida as pessoas.
Desde que o Aikidô e as artes marciais em geral são disciplinas que ensinam técnicas capazes de lesionar ou matar um adversário, eles devem ser praticados com um sentido de seriedade e atenção a todos os detalhes devido aos riscos inerentes a pratica. O treino com um estado mental focado progressivamente leva ao cultivo do que pode ser descrito como “Espírito Marcial”.
Nós usamos o termo “Marcial” aqui com o mesmo sentido de “Bu” em Japonês, como na interpretação do Fundador, de “Budô”, normalmente traduzido como “arte marcial”. O “Bu” envolvem dois conceitos-chave. Em primeiro lugar, isso conota um sistema oriental de habilidades de luta cuja origem inicialmente almejava o ensino da Defesa Pessoal. O “Bu” também incorporou o sentido de atividades, ou busca, para levar o praticante através de um caminho para o desenvolvimento espiritual. Ambos ideais estão contidos no Aikidô quando criado pelo fundador Morihei Ueshiba.
O “Bu”, ou elemento marcial, é uma parte tão vital da prática do Aikidô que retira-lo seria como reduzir esta arte a um mero sistema de exercícios ou prática para a saúde. Isso surge de um estado de consciência dos perigos do treino que inicia um tipo de tensão mental durante os treinos naquele momento produz um estado de elevada sensibilidade. Estes são alguns dos processos do dojô que promovem o desenvolvimento deste conjunto mental de marcialidade.
Etiqueta  
A etiqueta é um dos pilares para um comportamento apropriado num dojô.Muitas pessoas não compreendem a importância das formalidades apresentadas no dojô.Os costumes que são observados antes, durante e depois do treino são criados para estabelecer um cenário controlado onde técnicas perigosas podem ser treinadas de forma segura.A etiqueta não deve ser dispensada como um conjunto vazio de formas feitas fora do habitual.


O treino do Aikidô consiste em parceiros fazendo alternadamente o papel de naguê (Pessoa que projeta) e ukê (pessoa que é projetada). Ambos os movimentos no Aikidô são similares aos katás, ou formas, praticados por varias artes marciais clássicas, e algumas modernas também. As formas são, entretanto, menos estruturadas no Aikidô e servem como um guia para a execução característica da técnica que será modificada de acordo com as condições do combate.
No treino, a técnica a ser aplicada já é conhecida por ambos os parceiros antes de inicia o ataque. Isso é um fator adicional que assegura um ambiente seguro para a prática. Por isso é importante que o ukê ataque de forma clara e sem antecipar a resposta do naguê, baseado em seu conhecimento prévio. O naguê precisa de um ataque comprometido pra entender conceitos como estabilidade, mecanismos do corpo e fluxo de energia. A atitude marcial do ukê irá protegê-lo de lesões e promover seu progresso e o do seu parceiro. O uke também será recompensado pelo se esforço com um corpo flexível e bem condicionado, que está confortável para as quedas – que é uma experiência incomoda, e até perigosa, para a maioria das pessoas.




No katá, similar ao que foi descrito acima, o naguê sabe a natureza do ataque e então ele pode se concentrar no deslocamento apropriado do corpo, distância e desequilíbrio do seu parceiro. O stress emocional que normalmente acompanha um combate na vida real é inicialmente afastado neste nível básico de treinamento. O movimento inicial do naguê deverá desequilibrar seu parceiro, pois o ukê estará sem força para resistir, pois terá perdido seu centro de gravidade.
Os benefícios do naguê que praticar por muito tempo a ponto das técnicas de Aikidô tornarem-se sua natureza secundária. Ele aprende a reeducar seu instinto para resistir a um ataque em favor de um tipo de combinação de respostas o que caracteriza as técnicas do Aikidô. Ele aprende a manter uma serenidade física e mental frente a ataques que poderiam ser perturbadores para uma pessoa sem treinamento. Conforme o processo de aprendizado desenrola-se, sendo ou não consciente, o naguê desenvolve um nível avançado de sensibilidade que chega a todos que o rodeiam. Ele se torna apto a distinguir o que constitui uma ameaça real, do que não constitui uma ameaça real. Essa atitude de alerta constante é o que diferencia as pessoas com conhecimentos do Budô e é um componente fundamental para o espírito marcial.



Praticantes de Aikidô devem regulamente rever suas atividades normais ou circunstâncias para identificar áreas de perigo, ou de fraqueza, que podem prejudicar a atenção.
Eis um exemplo específico. Ás vezes os Aikidokas vêem falhas em sua arte, em comparação com outras artes marciais. Consequentemente isso se torna motivo para debater os cenários do tipo “e se...” para discutir a eficácia das técnicas do Aikidô.Mas nós estamos realmente treinando para estarmos aptos a nos defender de um campeão de karatê,de um boxeador profissional ou de um lutador olímpico de luta romana ? Como canalizar nossa energia para essas metas irá nos ajudar em nossas vidas, para nos preparar para os tipos de ataque a que estamos expostos? Não existe uma forma real de ordenar as artes em uma ordem hierárquica de eficácia, pois nenhum objetivo padrão pode ser inventado para medir os méritos relativos. Esse exercício mental pode proporcionar um bom tema para um boletim de discussões, mas a hipótese de qualquer confronto tornará qualquer conclusão puramente especulativa.
Deste modo, não devemos ver nossos treinos como uma perda de tempo já que nossas habilidades no Aikidô poderão não ser equiparadas a de um lutador profissional. Se esta fosse realmente nossa meta, nós não deveríamos estar treinando Aikidô em primeiro lugar. Isso não é o estado que devemos trazer acidentalmente para o treino de Aikidô, ou estabelecer resultados medíocres. O ponto é que a nossa meta derradeira deve ser a proteção da vida, liberdade e posses. E não derrotar um oponente em um confronto.




Vamos admitir que um levantamento de nosso ambiente nos leva a concluir que uma de nossas grandes preocupações seja um ataque físico ocasional.Nos ficaríamos surpresos enquanto andamos pela rua, dirigimos um carro ou mesmo quando estamos em casa.Em nosso mundo real o assaltante estará provavelmente empunhando um arma de fogo, ou uma faca, e deve ter um ou mais cúmplices.
O elemento surpresa é uma das principais razões para estes tipos de ataques ocasionais acontecerem. É freqüente a falta de sofisticação do ataque, mas o fato da vítima ser pega desprevenido o que termina com ela sendo ferida ou morta.

Assim provavelmente não podemos saber a natureza exata de um ataque surpresa, ou mesmo se algum dia seremos vítima de um assalto, o que podemos fazer é manter um nível preparo psicológico geral mais do que um conhecimento de determinadas técnicas de defesa pessoal. Devemos desenvolver um estado de alerta constante e sermos capazes de responder instintivamente a ameaças inesperadas. Devemos nos tornar indivíduos saudáveis, flexíveis, e bem condicionados capazes de adaptar rapidamente a situações desafiadoras.






Isso nos leva a uma questão perfeitamente racional. Porque estudar Aikidô, e não algo de aplicabilidade mais imediata para os incidentes da violência urbana como o uso de armas de fogo ou habilidades de luta de rua? Dependendo das circunstâncias de cada um praticar outras disciplinas pode realmente ser uma boa idéia
Existe um certo número de fortes argumentos para os benefícios de um treinamento cruzado. Dito isso, outra questão atrativa para treinar Aikidô tem a ver com o segundo componente do Kanji “Bu” mencionado anteriormente. Assim, Aikidô é também um caminho para o desenvolvimento espiritual.Ele contém interiormente o imperativo moral de respeita e cuidar de todos os seres vivos.O Aikidô projeta uma visão idealística de um mundo em harmonia e suas técnicas apresentam esta visão tão abstrata em algo tangível, no contexto físico. Essa era a visão de fundador Morihei Ueshiba e deve ser mantida na memória dos praticantes de Aikidô. Isso parece ser uma excelente formula pra se viver em um mundo cheio de perigo e discórdias.


Epílogo: Tomando duras decisões em tempos difíceis.

A maioria do tempo, os desafios que enfrentamos em nossas vidas diárias não envolvem confrontos físicos. Na maioria do tempo, nossas batalhas são travadas em um plano psicológico interior, enquanto lutamos com a vida, seus problemas intermináveis e incertezas. O espírito marcial cultivado em anos de treinamento de Aikidô, poderá ser um bem de grande valia nestes tempos.
Em 11 de Setembro de 2001, dia que será lembrado por todos aqueles tocados por suas conseqüências. O mundo entrou em um tempo de crises política e espiritual. Em meras duas semanas depois um grande seminário de Aikidô estava planejado para acontecer na Califórnia. Umas 300 pessoas já estavam inscritas e aguardavam o evento. O instrutor convidado agendado para voar do Japão prestou atenção aos avisos do governo japonês, parentes e amigos e decidiu por cancelar a viajem. Isso foi provavelmente uma decisão lógica frente a circunstancias extremas.
Os responsáveis pelo evento estavam em um dilema. Eles deveriam cancelar o evento e arcar com uma dolorosa perda financeira junto com o desapontamento de seu plano não realizado? E as pessoas que já estavam inscritas? Eles deveriam cancelar seus planos e entrarem em um cárcere mental onde eles deixam de realizar seus afazeres por temerem o desconhecido?
Neste caso em particular uma solução satisfatória foi elaborada. Os responsáveis pediram para um grupo de instrutores antigos para dividirem as responsabilidades no ensino das técnicas na falta do instrutor convidado. Essa decisão permitiu que o seminário fosse realizado, mesmo sob condições adversas. Mais da metade dos convidados pra comparecer estava presente. Esse é um exemplo específico de como somos confrontados em nosso dia-a-dia por situações que nos chama para entrarmos em nossos treinos marciais para encontrarmos soluções aprorpiadas onde aparentemente não existem.
Como responsáveis da Aiki Expo ano passado ,haviam momentos onde não tínhamos a menos idéia de onde um evento mundial deveria acontecer.Nós tínhamos que aceitar constantemente a possibilidade  de que a Expo poderia ser superarada por  eventos políticos e militares não aconteceria.Por fim, a Expo foi de fato realizada e foi um sucesso ilimitado.
O evento deste ano, Aiki Expo 2003, foi novamente exposta a mesma sombra da trama de nossos líderes mundiais. Por isso devemos tomar planos de contingências  em caso de alguma situação de emergência venha a acontecer e ter impacto sobre o evento.Apesar destas incertezas, estou confiante que a Expo acontecerá conforme o planejado.Não apenas acontecerá, mas continuará a quieta revolução que armamos no sentido de desafiar as práticas de treinamento e melhorado a qualidade geral da arte.
Stanley Pranin
February 2003

Conto - Verdadeiro Mestre

Verdadeiro mestre

Yagyu Tajima no Kami Munenori foi um grande espadachim e mestre de artes marciais de duas gerações de xoguns. Em suas conclusões intuitivas, expressa como "mente comum que não conhece regras", existe um ditado que diz: "Não existe táticas militares que se apliquem a um homem de grande força".
"Certo dia, um dos vassalos do xogum aproximou-se de Tajima no Kami e pediu-lhe que o aceitasse como discípulo, ao que Yagyu respondeu: - Pelo que vejo, o senhor já é um mestre. Peço-lhe que me diga a que escola pertence, antes que entremos na relação mestre-discípulo.
O guarda observou que se envergonhava de dizer, mas jamais tinha aprendido a arte da esgrima.- Mas eu nunca pratiquei nenhuma arte marcial - respondeu o homem.
- O senhor está zombando de mim? Sou o mestre do venerável xogum e sei que meus olhos jamais se enganam.
- Lamento ofender a sua honra, mas a verdade é que jamais tive qualquer conhecimento desta arte - insistiu o guarda.
- O senhor veio praticar o Tajima no Kami como esporte? Estou errado em achar que o senhor é um dos professores do xogum? - perguntou mestre Yagyu, mas o homem jurou que não e então, frente a tão segura negativa, o mestre vacilou um momento, ao final do qual disse: - Como o senhor afirma, não vou desmenti-lo, mas seguramente o senhor é mestre em alguma outra disciplina, embora eu não saiba qual seja'.
Respondeu-lhe o guarda: - Devo dizer-lhe que existe algo no qual me considero mestre. Quando eu era criança, ocorreu-me a idéia de que o guerreiro é um homem que não vive sua vida a se lamentar e não tem o direito de temer a morte em qualquer circunstância. Desde então lutei continuamente com a idéia de morte. Como acredito nisso há muitos anos, isso se tornou uma grande convicção. Hoje em dia, eu nunca penso na morte. Talvez seja a isso que o senhor se refere'.
Mal ouvira tais palavras, mestre Yagyu ficou muito impressionado com a resposta e exclamou: - Alegro-me que minha impressão estava certa, pois o princípio mais profundo da arte da espada é atingir a libertação da idéia de morte. Tenho mostrado essa meta a centenas de discípulos, mas até o momento nenhum alcançou o grau supremo na arte da espada. O senhor não precisa de qualquer treinamento, pois já é um mestre'."
Dizem que depois disso, Yagyu Munenori concedeu imediatamente o certificado ao vassalo do xogum.
- História de Muragawa Soden
Hagakure, Século XVII
"Viver sem medo da morte não significa que, durante as horas felizes, nos gabemos de não tremer diante dela, nem que possamos afirmar que a enfrentamos com segurança. Porém, quem domina a vida e a morte está livre de todo o temor, a tal ponto que não é mais capaz de experimentar a sensação de medo."
- A arte cavalheiresca do arqueiro zen,
Eugen Herrigel

terça-feira, 24 de novembro de 2009

KARATE SENTE NACHI

NÃO EXISTE O PRIMEIRO ATAQUE NO KARATE

-Acredito que se substituirmos a palavra Aikido por Karate neste texto, muitos aikidoistas se conscientizarão do porque é preciso praticar um aikido vigoroso e eficiente como defesa pessoal para que ele possa construir um espirito forte. Procuramos treinar e recomendar o treinamento marcial buscando a marcialidade, mas como ferramenta de iluminação espiritual. A propósito....todo verdadeiro Budo (Caminho Marcial Japones) é assim desde que corretamente praticado.


Presidente John Adams em "Não existe um primeiro ataque “
por Jeff Brooks -Fonte Aikido journal.
Tradução - Jaqueline Sá Freire (Instituto Takemussu - Hikari Dojo – Rio de Janeiro)


No livro "John Adams" de David McCullough, uma biografia do segundo presidente dos Estados Unidos, podemos observer a vida de Adams enquanto ele percorre muitos caminhos, como advogado, fazendeiro, professor, revolucionário, orador, membro do primeiro Congresso Continental e, eventualmente, presidente. John Adams viveu em um mundo em que a Guerra e a ameaça de Guerra eram fatos normais da vida. A forma como ele lidou com este conflito marcial há 200 anos atrás tem lições relevantes para nós, como artistas marciais do século 21.
No livro, McCullough escreve:
Uma manhã, observando suas netas, Susanna e Abigail, assoprando bolhas de sabão com um de seus cachimbos de argila, Adams percebeu a “lição alegórica” da cena. Adams escreveu: "elas enchem o ar da sala com suas bolhas, seus balões de ar, que rolam e brilham refletindo a luz da lareira e das velas, e que são muito bonitas. Elas não poderiam ser um símbolo mais perfeito dos cenários político e teológico da vida humana. Só a moralidade é eterna! Todo o resto são balões e bolhas, do berço ao túmulo”.
Adams, que tinha sido um derrubador de poderes e então era um homem velho, refletiu sobre a impermanência dos fenômenos da vida. Quando praticamos artes marciais, mesmo ao nos prepararmos para o conflito, nos preparamos para encarar as necessidades da vida, não devemos esperar até a idade madura para refletirmos sobre o que é que realmente durará. Devemos indagar o que realmente vai afetar a qualidade de nossas vidas e das pessoas que tocamos. Posso dizer que pelo meu ponto de vista e pelo ponto de vista de John Adams, o importante não é a acumulação de poder em si, nossas graduações, títulos, troféus ou conhecimento. O que importa é a qualidade da energia, a determinação, o cuidado e gentileza, o foco, a auto-maestria, auto disciplina e a decência que incorporamos e passamos adiante para as pessoas a quem ensinamos e com as quais praticamos. Se nossa influência sobre esses assuntos for boa, ela permanecerá quando nós e as pessoas que conhecemos não existirmos mais, talvez po r gerações.
Para John Adams isso não era uma questão de filosofia abstrata. Ele se preocupava seriamente com a auto-defesa durante seu tempo na presidência. O princípio político que ele seguia a nível nacional me lembrou do principio do "karate ni sente nashi" (Não existe primeiro ataque no karate), o que seguimos no karate-do.
Durante seu tempo na presidência, a posição de John Adams sobre a defesa nacional era combatida por ambos os lados do espectro político. Dos dois partidos que se opunham a ele, um grupo defendia grandes gastos na defesa nacional e a ida imediata à guerra. O outro partido se opunha ao gasto com defesa e à ida a guerra. Adams tinha sofrido de primeira mão a Revolução Americana, e sabia o que significava uma luta. Ele acreditava que, sob as circunstâncias, a fraqueza tornava o ataque inevitável. Ele apoiava uma forte defesa nacional ao mesmo tempo em que lutava com todas as forças para evitar a guerra. Mas a posição de Adams prevaleceu e ele provou que estava certo.
Esta é uma boa demonstração do principio, familiar aos muitos praticantes do karate tradicional de Okinawa, do "sem ataque inicial" – ao treinar com constancia e atenção. “Sem ataque inicial" não é uma questão de pacifismo ou de passividade. É a prática da estratégia marcial e da moralidade ao mesmo tempo.
Parece claro que aos 90 anos a visão de John Adams sobre a impermanência das coisas e a resistência da virtude foi possível devido à forma como ele viveu sua vida. Ele foi vigoroso. Por fim sua mente estava em paz. No final de sua vida ele não remoia rancores, não temia o declínio de suas forças nem buscava um lugar na história. Ele era capar de distinguir o que era importante do que não era. Ele foi corajoso e forte. Sua mente era clara. Ele era capaz de compreender o que duraria e o que desapareceria.
Sua habilidade para obter este grau de clareza e compreensão foi o resultado da forma como ele viveu. É difícil para nós vermos como nossas ações do corpo, da mente, e das palavras (o termo técnico, do sânscrito, é nosso "karma") influencia a qualidade de nossa compreensão. Mas se olharmos atentamente veremos que nossas mentes condicionam nossas escolhas, a qualidade de nossas vidas e o impacto que temos sobre outras pessoas.
Por isso é útil compreendermos a fundamentação física do treinamento mental no karate. A idéia de "treinamento mental" no karate envolve um conceito muito mais amplo de mente que o que normalmente usamos no ocidente, em que a mente e o corpo normalmente são separados um do outro. Compreender a fundamentação física do treinamento mental do karate nos ajuda a explicar a relação entre a forma como nosso treinamento físico condiciona nossa mente, a e forma como isso influencia a maneira como tomamos decisões em situações de conflito ou não. Isso nos dá uma visão sobre a importância do principio do “sem ataque inicial”.
Quando usamos a palavra "mente" nos referimos a funções mentais muito diferentes. As que são importantes para o treinamento mental do karate incluem: a ligação entre nossos sentidos, mente e músculos, sensação, categorização, conceituação, cognição, cálculo, reflexão, percepção, atenção, compreensão, emoção, percepção (compreensão da própria atividade mental), estabilidade mental, clareza, noção de si, orientação filosófica, conhecimento, força de vontade, intenção, mente-acima-do-pensamento e compreensão da realidade... E todas estas coisas normalmente são amontoadas sob termo "mente.”.
Todos estes aspectos da mente possuem fundamentação física, e são todos susceptíveis a mudanças positivas através do bom uso do corpo. Isso apenas é lógico porque na realidade o corpo não é separado da mente. Eles estão integrados, e agem em conjunto.
Assim, na prática das artes marciais nem a “busca do conhecimento” nem a repetição mecânica dos movimentos serão suficientes para tornar suas capacidades de defesa mais eficientes, nem aprofundarão seu desenvolvimento como ser humano.
Na pratica do karate temos que saber o que estamos buscando, adquirir os meios que nos levarão adiante e seguir em frente. Devemos ser pacientes e firmes em nossos esforços. Devemos ser sempre escrupulosos ao examinar nossas motivações, nossos métodos e os resultados que estamos atingindo. Não devemos ser desviados, intimidados ou atrapalhados. Assim podemos esperar terminar o trabalho antes que o tempo termine. Isso é treinamento mental tanto quanto treinamento físico.
Com este alto grau de tenacidade e de atenção descobriremos o propósito do karate. Então poderemos usá-lo quando uma emergência ou as circunstancias exigirem – de um ponto de vista estratégico, como o de Adams, ou em nossa própria doutrina de “sem ataque inicial”.
Se o propósito do treinamento em artes marciais fosse principalmente matar, você poderia pular o trabalho e arranjar algum TNT. Se fosse apenas para se manter em segurança, você poderia arranjar um bunker e uma roupa de Kevlar. Se fosse principalmente para manter viva a arte que as pessoas de Okinawa praticavam há séculos, estaríamos carregando facas na cintura e enfrentando piratas Javaneses no Estreito de Malucca, de pé na proa de nossos navios.
Em um nível nacional, os pensamentos de John Adams sobre a defesa nacional estavam corretos para a sua época. A um nível pessoal, a habilidade em auto-defesa nos ajuda a cumprir nossas obrigações para com nós mesmos, nossas famílias e nossas comunidades. Livrar-nos e aos outros do medo, do sofrimento e da morte é uma grande obrigação, uma tarefa urgente e difícil. Exige que cuidemos de nossos corpos e mentes, que pratiquemos até o limite de nossas capacidades. Exige que transformemos nossos corpos e mentes comuns em algo que é profundamente e completamente humano. E não podemos desperdiçar tempo. Recebemos as ferramentas. Às vezes elas parecem simples demais Às vezes parecem tão maravilhosas como se estivessem fora do alcance. Mas nós as possuímos, como praticantes. Devemos usá-las bem.
Cada estágio é importante. Nenhum deve ser negligenciado: (a) ficar forte, flexível e saudável. (b) Regular seu corpo e a respiração. (c) Estabilizar e clarear a mente. (d) Criar relacionamentos generosos. (e) Servir às pessoas que precisam de você. (f) Ser um mestre de defesa-pessoal. Então você será destemido. Então você saberá o que está defendendo. Você saberá como melhor defender. Você poderá usar bem sua gentileza e sua força. Você poderá ser forte sem ser “militar”, e pacífico sem ser passivo.
A propósito, da mesma forma que aconteceu com o presidente que foi forte e pacífico, pode acontecer que seus esforços e suas boas qualidades, como um praticante sério, não sejam apreciadas. Pessoas poderão ficar no seu caminho e lhe criar dificuldades. Você poderá se sentir solitário. Se você for provocado para ficar irado, não fique. Continue fazendo o que é certo. Assim, no fim do dia, ou no fim da vida, verá que o que você fez é bom e permanecerá.
Jeffrey M. Brooks é um faixa preta Go Dan (quinto grau) de Matsubayashi Shorin Ryu, treinando em Okinawa, Japão, e nos Estados Unidos, com Shoshin Nagamine, o fundador do estilo, Takayoshi Nagamine, seu sucessor, e com muitos outros da linha do Matsubayashi Ryu e das tradições chinesas relacionadas. Faz seus estudos sobre o Budismo e a prática com o Rev. Issho Fujita, diretor residente do Valley Zendo e com Geshe Michael Roach do Asian Classics Institute. Ele tem a graduação de M.F.A. da NYU Film School e trabalha como escritor de discursos para pessoas públicas. Ele é o fundador e diretor do Northampton Karate e do Northampton Zendo em Northampton, Massachusetts, dando aulas diárias para adultos e crianças desde 1988. (www.northamptonkarate.com)
http://www.northamptonkarate.com
Fonte do Artigo: http://www.martialartsarticles.com

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Entrevista com o Fundador do Aikido Ueshiba

A seguinte entrevista com O Sensei e seu filho, Kisshomaru, teve lugar cerca de vinte anos atrás e foi publicada em Aikido, por Kisshomaru Ueshiba,Tokyo, Kowado, 1957, pp. 198-219. Foi vertida do japonês por Stanley Pranin e Katsuaki Terasawa e conduzida por dois jornalistas anônimos. Contém uma riqueza de lances valiosos da vida de O Sensei, da história e do desenvolvimento do Aikido.

A: Quando eu estava no colégio, meu professor de filosofia nos mostrou o retrato de um famoso filósofo e agora estou impressionado com a semelhança entre vocês, Sensei.

UESHIBA: Entendo. Talvez eu devesse ter entrado no campo da filosofia ao invés. Meu lado espiritual é mais forte do que o lado físico.

B: Dizem que o Aikido é muito diferente do Karate do Judo.

UESHIBA: O Aikido é totalmente diferente daquilo que as pessoas em geral pensam a respeito das artes marciais.

B: Então, o que é o Aikido?

UESHIBA: Na minha opinião, pode-se dizer que é a verdadeira arte marcial. A razão disto é que ele é uma arte marcial baseada na verdade universal. Este universo é composto de muitas partes diferentes e ainda assim, o universo como um todo é uno como uma família e simboliza o estado último da paz. Por ter esta visão do universo, o Aikido não pode ser nada além de uma arte marcial da harmonia e de não violência. Por isso, pode se dizer que o Aikido é mais uma manifestação do Criador do Universo. Em outras palavras, o Aikido é como um gigante (imenso em natureza). Portanto, no Aikido, o céu e a terra se tornam os campos de treinamento. O estado mental do aikidoista deve estar pacificado e totalmente livre da violência. É dizer, aquele estado mental especial que transforma a violência em um estado de harmonia. E acho que este é o verdadeiro espírito das artes marciais japonesas. Esta terra nos foi dada para que a transformássemos num paraíso. A atividade guerreira é totalmente fora de contexto.

A: Então, ele é muito diferente das artes marciais tradicionais.

B: Então, isto significa que o senhor esteve ligado a Tenryu durante algum tempo?

UESHIBA: Sim. Ele ficou em minha casa por cerca de três meses.

B: Isso foi na Manchúria?

UESHIBA: Sim. Eu o conheci quando faziamos a ronda depois de uma celebração marcando o décimo aniversário da instalação do governo da Manchúria. Havia um homem de boa aparência na festa e muitas pessoas estavam curiosas, fazendo comentários como: "Este Sensei tem uma tremenda força. Que tal se testar contra ele?" Perguntei a alguém ao lado quem era ele. Me foi explicado que era o famoso Tenryu que havia de afastado da Sumo Wrestler's Association. Fomos então apresentados. Finalmente, acabamos medindo nossas forças. Sentei e disse a Tenryu, "Por favor, tente me empurrar. Empurre forte, não há necessidade de se conter." Por conhecer o segredo do Aikido, eu não poderia ser movido uma polegada. Mesmo Tenryu pareceu surpreso com isto. Como resultado dessa experiência, ele se tornou um estudante de Aikido. Era um bom homem.

A: Sensei, o senhor esteve também na Marinha?

UESHIBA: Sim, por um longo período. Começando por 1927 ou 28, por cerca de 10 anos. Eu era professor em meio período na Academia Naval.

B: O senhor instruía os soldados na época em que ensinou na Academia Naval?

UESHIBA: Ensinei muito os militares, começando pela Academia Naval em 1927-28. Por volta de 1932 ou 1933, comecei uma aula de artes marciais na Escola Toyama para o Exército. Então em 1941-42, ensinei Aikido aos alunos da Academia de Polícia Militar. Além disso, em certa ocasião, dei uma demonstração a convite do General Toshie Maeda, Superintendente da Academia do Exército.

B: Já que o Senhor treinou soldados, deve ter havido muitos tipos rudes e muitos episódios.

UESHIBA: Sim. Fui até mesmo emboscado, uma vez.

B: Por considerarem-no um professor autoritário?

UESHIBA: Não. Não foi por causa disso. Era para testar a minha força. Foi no tempo em que comecei a ensinar Aiki para a polícia militar. Uma noite, enquanto caminhava pelos campos de treinamento, senti que alguma coisa estranha estava acontecendo. Senti algo errado. Subitamente, de todas as direções, de trás dos arbustos e depressões, muitos soldados apareceram e me rodearam. Começaram a me golpear com espadas e rifles de madeira. Mas eu estava acostumado com aquele tipo de coisa e por isso, não me incomodei. Enquanto tentavam me atingir, eu girava meu corpo desta e daquela forma e eles caíam facilmente enquanto os golpeava. Finalmente, todos ficaram exaustos. De qualquer modo, o mundo é cheio de surpresas. Outro dia encontrei um dos homens que tinham me atacado. Sou conselheiro na Military Police Alumnae na Prefeitura de Wakayama. Durante um encontro recente, um indivíduo me reconheceu e veio sorrindo em minha direção. Depois de termos conversado alguns minutos, entendi que ele era uma dos homens que havia me atacado naquele dia, muitos anos atrás. Enquanto coçava a cabeça, me contava o seguinte: "Sinto muito por aquele incidente. Naquele dia, discutíamos se o novo professor de Aikido era ou não realmente forte. Uma parte de nós, policiais militares de sangue quente, conversava a respeito e decidimos testar o novo professor. Cerca de 30 homens ficaram na espreita. Ficamos completamente assombrados com o fato de que 30 homens auto confiantes não pudessem ter feito nada contra a sua força."

C: Houve outros episódios enquanto o senhor esteve na Escola Toyama?

UESHIBA: Medição de forças?... Um incidente teve lugar, acredito que antes do episódio com a polícia militar. Vários capitães que eram instrutores na Escola Toyama me convidaram para testar minha força contra eles. Todos estavam orgulhosos de suas habilidades dizendo coisas como: "Sou capaz de erguer tantos e tantos pesos", ou "parti um tronco de tantas polegadas de diâmetro". Se reuniram ao meu redor para testar meu poder. Expliquei a eles: "Não tenho força como vocês mas posso derrubar pessoas apenas com o meu dedo mínimo. Sinto por vocês se os arremessar. Então, vamos fazer isto, ao invés." Estendi meu braço direito e apoiei a ponta do dedo indicador na borda de uma mesa e os convidei a apoiarem seus ventres sobre o meu braço. Um, dois e então três oficiais se apoiaram sobre ele e naquele momento, todos arregalaram os olhos. Continuei até que seis homens estivessem apoiados e então pedi um copo de água ao oficial que estava em pé perto de mim. Enquanto eu tomava a água com a mão esquerda, todos estavam silenciosos, trocando olhares.

B:
À parte do Aikido, o senhor deve ter uma tremenda força física.

UESHIBA: Na verdade, não.

KISSHOMARU UESHIBA:
É claro que ele tem força, mas ela deve ser descrita como o poder do ki, mais do que força física. Algum tempo atrás, quando fomos a uma nova colônia no país, vimos sete ou oito lavradores tentando em vão levantar um enorme tronco de árvore. Meu pai parou para olhar por um instante e então pediu que se afastassem um pouco para que pudesse tentar. Levantou-o facilmente e de pronto, carregou o tronco. É totalmente inconcebível fazer este tipo de coisa usando mera força física. Também houve um incidente envolvendo um certo Mihamahiro.

B: O mesmo Mihamahiro da Associação de SumoTakasago Beya?

UESHIBA: Sim. Ele era da Província de Kishu. Quando estive em Shingu em Wakayama, Mihamahiro estava bem colocado nas classificações de Sumo. Tinha tremenda força e podia erguer três vigas que pesavam várias centenas de libras. Quando soube que Mihamahiro ia ficar na cidade, convidei-o para um encontro. Enquanto conversávamos, Mihamahiro disse, " Também ouvi dizer que o senhor, Sensei, possui grande força. Por quê não fazemos um teste?". "Está certo. Ótimo. Posso imobilizá-lo apenas com o meu dedo indicador", respondi. Então deixei que ele me empurrasse enquanto eu estava sentado. Este sujeito, capaz de erguer pesos imensos, bufou e bufou mas não pode me mover. Depois, redirecionei sua força para além de mim e ele saiu voando. Quando caiu, prendi-o com o dedo indicador, ficando totalmente imobilizado. Foi como um adulto prender um bebê. Então sugeri que tentássemos outra vez e deixei que ele me empurrasse contra a testa. Entretanto, ele não pode me mover de forma alguma. Então estendi minhas pernas para a frente e, balançando, tirei- as do chão e fiz com que me empurrasse. Mesmo assim, ele não pode me mover. Ficou surpreso e começou a estudar Aikido.

Parte II

B: Então, em budo, não é bom ser forte. Desde a antigüidade A unificação da ken e do zen é ensinada desde a antigüidade. Sem dúvida, não se pode compreender a essência do budo sem esvaziar a mente. Nesse estado, nem o certo ou o errado têm significado.

UESHIBA: Como eu disse antes, a essência do budo é o Caminho do masakatsu e agatsu.

B: Ouvi uma estória sobre como o senhor se envolveu em um combate com cerca de 150 trabalhadores.

UESHIBA: Estive? Se me lembro... Deguchi Sensei foi à Mongólia em 1924 para realizar o seu objetivo de uma Comunidade Asiática maior, alinhada com a política nacional. Eu o acompanhei a seu pedido, embora estivesse convocado para o exército. Viajamos pela Mongólia e Manchuria. Neste último país, encontramos um grupo de bandidos montados e houve um pesado tiroteio . Devolvi o fogo com uma mauser (pistola alemã) e então comecei a correr para o meio dos bandidos, atacando-os violentamente e eles se dispersaram. Tive sucesso em escapar do perigo.

A: Sensei, sabemos que o senhor tem muitas ligações com a Manchuria. O Senhor passou muito tempo lá?

UESHIBA: Desde aquele incidente, tenho ido à Manchúria com bastante freqüência. Eu era conselheiro para artes marciais na organização Shimbuden, bem como na Kenkyoku University na Mongólia. Por esta razão, sou bem recebido naquele país.

B: Hino Ashihei escreveu uma estória chamada "Oja no Za" na Shosetsu Shincho, na qual relata a juventude de Tenryu Saburo, dissidente do mundo do Sumo e do seu encontro com a arte marcial do Aikido e seu verdadeiro espírito. Isto tem algo a ver com o senhor, Sensei?

UESHIBA: Sim.

UESHIBA: Sem dúvida, é muito diferente. Se olharmos para trás no tempo, veremos o quanto as artes marciais têm sido maltratadas. Durante o Período Sengoku (1482-1558, "Sengoku - = países em guerra) os suseranos locais usaram as artes marciais como uma ferramenta de luta a serviço de seus próprios interesses e para satisfazer o seu orgulho. Acho isto totalmente inadequado. Embora eu mesmo, durante a guerra, tenha ensinado artes marciais a soldados para serem usadas com o propósito de matar, fiquei profundamente perturbado depois que o conflito terminou. Isto me motivou a descobrir o verdadeiro espírito do Aikido sete anos depois, ao tempo em que surgiu a idéia de construir um paraíso na terra. A razão disto foi que, embora o céu e a terra (isto é, o universo físico) tenha alcançado um estado de perfeição e seja relativamente estável em sua evolução, a raça humana (o japonês, em particular) parece estar em um estado de revolução. Antes de mais nada, devemos mudar esta situação. A compreensão desta missão é o caminho para a evolução do homem universal. Quando cheguei a esta compreensão, concluí que o verdadeiro estado do Aikido é do amor e da harmonia. Assim, o bu (marcial) em Aikido é a expressão do amor. Eu estudei o Aikido para servir meu país. Desta forma, o seu espírito só pode ser o amor e a harmonia. O Aikido nasceu de acordo com os princípios de funcionamento do universo e portanto, ele é um budo (arte marcial) de vitória absoluta.

B: O senhor poderia falar a respeito dos princípios do Aikido? O público em geral vê o Aikido como algo místico, como ninjutsu, já que o senhor, Sensei, derrubou oponentes enormes com a velocidade da luz e levantou objetos pesando várias centenas de libras.

UESHIBA: Ele apenas parece ser místico. Em Aikido usamos completamente o poder do oponente. Assim, quanto maior a força que ele usa, mais fácil é para você.

B: Então, nesse sentido, há aiki em Judo, também, já que no Judo você se sincroniza com o ritmo do seu oponente. Se ele puxa, você empurra. Você se move de acordo com este princípio e o faz perder o equilíbrio e então aplica a sua técnica.

UESHIBA: Em Aikido, não existe agressividade, em absoluto. Atacar significa que o espírito já foi derrotado. Aderimos ao princípio da absoluta não resistência, que equivale a dizer, não nos opomos ao atacante. Assim, não há oponente em Aikido. A vitória em Aikido é masakatsu e agatsu; desde que ela seja obtida sobre todas as coisas de acordo com a missão do céu, você possui força absoluta.

B: Isto significa go no sen ? ( Este termo refere-se a uma resposta tardia a um ataque)

UESHIBA: Não, em absoluto. E tampouco é uma questão de sensen no sen ou go no sen. Se eu tentasse verbalizar, diria que você controla seu oponente sem tentar controlá-lo, isto é, o estado de vitória contínua. Não existe nenhuma questão de vencer ou perder e neste sentido, não há oponente em Aikido. Mesmo que você tenha um, este se torna parte de você, um parceiro que se pode controlar facilmente.

B: Quantas técnicas existem em Aikido?

UESHIBA: Existem cerca de 3.000 técnicas básicas e cada uma delas tem 16 variações... Assim, existem milhares. Dependendo da situação, você cria novas técnicas.

A: Quando o senhor começou a estudar artes marciais?

UESHIBA: Com 14 ou 15 anos. Primeiro aprendi Tenshinyo-ryu Jiujitsu com Tozawa Tokusaburo Sensei, e então Kito-ryu, Yagyu-ryu, Aioi-ryu, Shinkage-ryu, todas formas de Jiujitsu. Entretanto, pensei que deveria existir uma verdadeira forma de budo em algum lugar. Tentei Hozoin-ryu Sojitsu e Kendo. Mas todas estas artes estão voltadas para o combate um a um e não puderam me satisfazer. Assim, visitei muitos lugares no país procurando o Caminho e o treinamento... mas foi tudo em vão.

A: O treino ascético do guerreiro?

UESHIBA: Sim, a procura pelo verdadeiro budo. Quando eu ia a outras escolas, não poderia nunca desafiar o Sensei do dojo. Uma pessoa responsável por um dojo tem obrigações com muitas coisas e assim é muito difícil para ele demonstrar a sua verdadeira habilidade. Eu lhe renderia o respeito adequado e aprenderia com ele. Caso me julgasse superior, renderia meus respeitos e voltaria para casa.

B: Então o senhor não aprendeu Aikido desde o começo.

UESHIBA: Não o chamávamos Aikido então. Estudei todas as artes marciais.

B: Quando foi que o Aikido nasceu?

UESHIBA: Como já disse, fui a muitos lugares buscando o verdadeiro budo. Então, quando eu estava com cerca de 30 anos, me estabeleci em Hokkaido. Em uma ocasião, durante uma estada no Hisada Inn em Engaru, Província de Kitami, encontrei um certo Takeda Sokaku Sensei do clã Aizu. Ele ensinava Daito-ryu Jijitsu. Durante os 30 dias em que aprendi com ele, senti algo como que uma inspiração. Mais tarde, convidei este mestre para vir à minha casa e junto com 15 ou 16 empregados, nos tornamos alunos, procurando pela essência do budo.

A: O Senhor descobriu o Aikido enquanto aprendia Daito-ryu com Takeda Sokaku?

UESHIBA: Não. Seria mais preciso dizer que Takeda Sensei abriu meus olhos para o budo.

A: Então, houve alguma circunstância especial envolvendo a sua descoberta do Aikido?

UESHIBA: Sim. Aconteceu desta forma. Meu pai ficou seriamente doente em 1918. Pedi para deixar Takeda Sensei e fui para casa. No caminho, me foi dito que se eu fosse a Ayabe perto de Kyoto e dedicasse uma prece, qualquer doença seria curada. Assim, eu fui e lá encontrei Deguchi Onisaburo. Depois disso, quando cheguei em casa, soube que meu pai já estava morto. Embora tenha encontrado Deguchi apenas uma vez, decidi me mudar para Ayabe com minha família e acabei por permanecer ali até o fim do período Taisho (por volta de 1925). Sim... Naquela época eu estava com 40 anos de idade. Um dia, eu me enxugava perto de um poço. De repente, uma cascata de ofuscantes luzes douradas desceu do céu envolvendo meu corpo. Então imediatamente meu corpo foi se tornando maior e maior atingindo o tamanho do universo. Enquanto eu era dominado por esta experiência, subitamente compreendi que não se deveria pensar em tentar vencer. A forma do budo deve ser a harmonia. É preciso viver em harmonia. Isto é Aikido, e a forma antiga da postura em Kenjitsu. Depois desta compreensão, fiquei emocionado e não pude conter as lágrimas.

Parte III

A: Quando o senhor diz imobilizar alguém com um dedo, o senhor pressiona um ponto vital?

UESHIBA: Essencialmente o que faço é o seguinte: Desenho um círculo ao redor da pessoa. Seu poder está dentro desse círculo. Não importa quão forte alguém seja; não pode estender a sua força para além desse círculo. Ele se torna fraco. Assim, se você a imobiliza enquanto você está fora desse círculo, pode prender a pessoa com o seu dedo indicador ou seu dedo mínimo. Isto é possível porque o oponente já se tornou fraco.

B: Mais uma vez, é uma questão de física. Também em Judo, quando você arremessa um oponente ou o imobiliza, você se coloca do mesmo modo. Em Judo, você se movimenta de várias maneiras para tentar posicionar o oponente da mesma forma.

A: Sua esposa é da Prefeitura de Wakayama?

UESHIBA: Sim. Seu sobrenome de solteira em Wakayama era Takeda.

A: O nome da família Takeda tem uma relação muito estreita com as artes marciais.

UESHIBA: Pode-se dizer que sim. Minha família tem sido leal à Casa Imperial por muitas gerações. E temos sido absolutamente sinceros em nosso apoio. Na verdade, meus ancestrais se desfizeram das propriedades e fortuna e mudaram-se a serviço da família imperial.

B: Deve ter sido bastante difícil para a sua esposa, já que o senhor também, Sensei, está constantemente se mudando desde a juventude.

UESHIBA: Eu estava muito ocupado e não tive muito tempo de lazer para passar em casa.

KISSHOMARU: A família de meu pai era abastada e ele pode se dedicar ao budo shugyo (treinamento rigoroso em artes marciais). E outra coisa, mais uma das suas características é que ele se preocupa pouco com dinheiro. O seguinte incidente teve lugar em certa ocasião. Quando meu pai se estabeleceu em Tokyo em 1926, em sua segunda visita à capital, primeiro veio sozinho e depois, foi seguido pela família que veio de Tanba em 1927. Nos estabelecemos em Sarumachi, Shibashirogane em Tokyo. Alugamos aquele lugar com a ajuda do Sr. Kiyoshi Yamamoto, um dos filhos do General Ganbei Yamamoto. Naquele tempo, meu pai possuía muitas propriedades ao redor de Tanabe, incluindo tanto terras cultivadas como não cultivadas e terrenos montanhosos. Entretanto, tinha pouco dinheiro e teve que pedir emprestado. A despeito disto, nunca precisou vender qualquer terra. E mais, quando seus alunos traziam oferendas mensalmente ele dizia, "não quero este tipo de coisa". Dizia-lhes que oferecessem ao Kami-Sama (uma divindade) e nunca aceitou dinheiro diretamente. E quando precisava, ele se apresentava humildemente em frente ao altar do Kami-sama e recebia presentes da divindade . Nunca pensamos em cobrar pelo budo. A sala de treinamento na época era o salão de bilhar na mansão do Conde Shimazu. Muitos dignitários, incluindo oficiais tais como o Almirante Isamu Takeshita bem como vários aristocratas vinham praticar. O nome que usávamos era "Aikijujitsu" ou "Ueshiba-ryu Aikijitsu".

B: Qual é a idade ideal para começar a treinar Aikido?

KISSHOMARU: Você pode começar por volta de 7 ou 8 anos de idade, mas o treinamento sério, ideal, deve começar aos 15 ou 16 anos. Fisicamente falando, a estrutura do corpo se torna mais vigorosa e os ossos mais fortes nessa idade. Além disso, o Aikido tem muitos aspectos espirituais ( é claro, assim como outras formas de budo ) e assim, nessa idade, começa-se a adquirir uma perspectiva do mundo e da natureza do budo. Assim, por tudo isto, eu diria que 15, 16 anos é uma boa idade para começar o estudo do Aikido.

B: Comparado com o judo, em Aikido há bem poucas ocasiões em que se se atraca com o oponente. Assim, não há necessidade de muita força física. Além disso, pode-se lidar não apenas com um, mas muitos oponentes ao mesmo tempo. Isto é realmente o ideal como budo. Mas, por outro lado, ele pode ser também usado como ferramenta em briga de rua. Nesse aspecto, há também muitos "brigões" que vêm estudar Aikido?

KISSHOMARU:
É claro, este tipo de indivíduo aparece também. Mas quando este tipo pratica o Aikido com a intenção de usá-lo como ferramenta para brigar, não fica muito tempo. O budo não é como dançar ou assistir um filme. Chuva ou sol, você deve praticar todo o tempo, durante o dia-a-dia para progredir. Em particular, o Aikido é como um treinamento espiritual praticado sob a forma de budo. Não pode nunca ser cultivado como ferramenta para aqueles que o usariam para a briga. Também, indivíduos com tendência à violência param de agir assim quando aprendem Aikido.

B: Compreendo... Através do treinamento constante, eles param de se comportar como "brigões".

UESHIBA: Como o Aikido não é um bu (método marcial) de violência mas uma arte marcial de harmonia, não se age violentamente. Você converte o oponente violento de forma gentil. Eles não podem se comportar assim por muito tempo.

B: Compreendo. Não é controlar a violência com a violência, mas transformar a violência em harmonia.

A: O que o Senhor ensina em primeiro lugar como fundamento do Aikido? Em Judo, aprende-se ukemi (queda)...

KISSHOMARU: Primeiro, a movimentação do corpo (Taisabaki) e então, o fluxo de ki...

A: o quê é o fluxo de ki?

KISSHOMARU: Em Aikido, treinamos constantemente o controle do ki do nosso parceiro através do movimento de nosso próprio ki, atraindo-o para o nosso próprio movimento. A seguir, aprendemos como girar o corpo, movendo-o juntamente com os braços e pernas. Então, o corpo se torna unificado e se move suavemente.

B: Assistindo a prática do Aikido, os alunos parecem cair naturalmente. Que tipo de treino vocês fazem para o ukemi?

KISSHOMARU: Diferente do Judo, onde você se atraca com o oponente, em Aikido quase sempre se mantém alguma distância. Consequentemente, um tipo mais livre de ukemi é possível . Ao invés de cair com um baque como no Judo, fazemos quedas circulares, uma forma muito natural de ukemi. Assim, praticamos aqueles quatro elementos com muita diligência.

B: Então vocês praticam Tai no sabaki (movimentação do corpo), ki no nagare (fluxo de ki), Tai no tenkan Ho (giro de corpo), ukemi e então começam a praticar técnicas. Que tipo de técnica o senhor ensina primeiro?

KISSHOMARU: Shihonage, uma técnica para arremessar um oponente em muitas direções diferentes. Isto é feito da mesma maneira que a técnica de espada. É claro, usamos bokken (espadas de madeira) também. Como eu disse antes, em Aikido, mesmo o inimigo se torna parte do seu movimento. Posso movê-lo como desejar. Segue-se então, naturalmente, que quando se pratica com quaisquer meios que se tenha disponíveis, como um bastão ou uma espada de madeira, estes se tornam também uma parte de você, como um braço ou uma perna. Portanto, em Aikido, aquilo que você está segurando deixa de ser um mero objeto, para se tornar uma extensão do seu próprio corpo. Em seguida, Iriminage. Nesta técnica, você entra assim que o oponente tenta golpeá-lo e nesse momento, aplicam-se dois ou três atemi (golpes em pontos dolorosos). Por exemplo, o oponente ataca a lateral do seu rosto com um soco ou com a mão-espada (tegatana). Usando a força do oponente, você faz uma abertura com o seu corpo para a esquerda e para trás, enquanto conduz a mão direita do atacante com suas duas mãos estendidas, continuando na direção do movimento. Então, segurando a mão do oponente, você a move em círculo ao redor da cabeça dele. Ele então cai com o braço "enrolado" ao redor cabeça... Isto também é o fluxo de ki. O oponente ataca com a mão direita; você move a mão na direção do ki dele...Há várias teorias sofisticadas a respeito. O oponente fica totalmente enfraquecido, ou melhor, a força do oponente é dirigida na direção em que você quer levá-lo. Assim, quanto mais força o oponente tiver, mais fácil é para você. Por outro lado, se você se chocar com a força dele, não pode nunca esperar derrotar uma pessoa muito forte.

Parte IV

UESHIBA: Além disso, em Aikido, nunca se vai contra a força do atacante. Quando ele o ataca, golpeando ou cortando com uma espada, há essencialmente uma linha ou um ponto. Tudo o que você precisa fazer é evitá-los.

KISSHOMARU UESHIBA: Depois fazemos as seguintes técnicas: suwari waza shomenuchi ikkyo, nikkyo; então técnicas de articulação e imobilização assim por diante...

B: O Aikido tem muitos elementos espirituais. Quando tempo leva para adquirir uma compreensão básica do Aikido, desde o princípio?

KISSHOMARU UESHIBA: Não posso generalizar, já que existem pessoas coordenadas e descoordenadas, mas quando alguém pratica por cerca de três meses, começa a ter alguma compreensão do que é o Aikido. E aqueles que tenham completado três meses de prática, treinarão por seis . Se praticar por seis, então poderá continuar por um tempo indefinido. Aqueles que têm apenas um interesse superficial desistirão antes do três meses.

B: Vai haver um exame de shodan no dia 28 deste mês. Quantos faixas pretas existem atualmente?

KISSHOMARU UESHIBA: A graduação mais alta é a oitava e existem quatro deles. Há seis faixas-pretas de sétimo grau . E os de primeiro grau são bastante numerosos, mas , é claro, isto inclui somente aqueles que contataram o Hombu Dojo depois da Guerra.

B: Sei que há um número considerável de pessoas aprendendo Aikido em países estrangeiros também.

KISSHOMARU UESHIBA: O Sr. Tohei tem visitado o Havaí e os Estados Unidos com o propósito de ensinar Aikido. O Aikido é mais popular no Havaí onde há 1200 ou 1300 praticantes. Esta estimativa para o Havaí seria equivalente a 70 ou 80.000 Aikidoistas em Tokyo. Há bem poucos faixas-pretas na França também. Há um francês que começou a estudar Aikido depois de se machucar praticando Judo. Eles queria experimentar o espírito do Aikido mas não foi possível conseguir isto na França. Sentiu que para buscar o verdadeiro espírito do Aikido, teria que ir ao berço da arte. Por esta razão, veio ao Japão. O Embaixador do Panamá também está estudando Aikido mas parece que o clima no Japão é muito frio e não pratica no inverno. Há também uma senhora chamada Onada Haru que foi a Roma estudar escultura. Vem ao dojo desde o tempo em que era estudante na Escola de Belas Artes de Tokyo. Acabei de receber uma carta onde diz ter conhecido um italiano que pratica Aikido e a tratou muito bem.

A: E a respeito da interpretação das técnicas do Aikido?

UESHIBA: Os pontos essenciais são masakatsu, agatsu e katsuhayai. Como eu disse antes, masakatsu significa a "vitória correta" e agatsu significa vencer de acordo com a missão celeste que foi dada a você. Katsuhayai representa o estado mental da "vitória rápida".

A: O Caminho é longo , não é?

UESHIBA: O Caminho do Aikido é infinito. Estou agora com 76 anos de idade mas continuo a minha busca. Não é uma tarefa fácil dominar o Caminho no budo ou nas artes. Em Aikido, você deve compreender cada fenômeno do Universo. Por exemplo, a rotação da Terra e o mais intrincado e longínquo sistema do universo. É um treinamento para a vida inteira.

B: Assim, Aiki é o ensinamento do Kami (Deus) tanto quanto um caminho marcial. Então, qual é o espírito do Aikido?

UESHIBA: Aikido é ai (harmonia). Você faz desta grande harmonia do universo o seu coração e então deve tornar sua própria a missão de proteção e de amor por todas as coisas. Realizar esta missão deve ser o verdadeiro budo. O verdadeiro budo significa vencer-se a si mesmo e eliminar o coração combativo do inimigo. Não, é um caminho de absoluta auto-perfeição no qual o verdadeiro inimigo é eliminado. A técnica do aiki é o treinamento ascético e um caminho através do qual se alcança um estado de unificação do corpo e do espírito pela compreensão do princípio do Céu.

B: Então Aiki é o Caminho para a paz do mundo.

UESHIBA: O objetivo último do Aiki é a criação de um paraíso na terra. De qualquer modo, o mundo inteiro deve estar em harmonia. Então não teremos necessidade de bombas atômicas ou de hidrogênio. Poderá ser um mundo confortável e prazeiroso.


"O Caminho é infinitamente vasto. Desde a antigüidade até o presente, até mesmo os maiores sábios foram incapazes de perceber e compreender a verdade; as explicações e ensinamentos dos mestres e santos apenas expressam parte do todo. Não é possível a alguém falar de tais coisas em sua integridade - apenas caminhe na direção da luz e do calor, aprenda com os deuses e através da virtude da prática devotada, torne-se um com o divino. Busque a iluminação ao longo deste gume"

terça-feira, 10 de novembro de 2009

O Básico da Pratica; Ser Livre Como a Natureza

Por Endo Seishiro, Aikido Saku Dojocho 8 Dan, Traduzido para o português por Jaqueline Sá Freire – Instituto Takemussu Hikari Dojo

O Aikido começou a se difundir a cerca de 50 anos no Japão, e nos últimos 35 anos se expandiu para o mundo. A popularidade do Aikido hoje é impressionante; organizações de Aikido já foram autorizadas pelo Hombu Dojo em mais de 70 paises, e mesmo ainda sem autorização, o Aikido está se tornando popular em vários outros paises. E enquanto o Aikido continua a se expandir, e o numero de alunos com mais de 20 a 30 anos de prática aumenta cada vez mais, eu fico imaginando qual é o tipo de prática que deveríamos almejar. Acredito que praticamos para adquirir um movimento dinâmico e uma liberdade que existe no coração do movimento. Entretanto, acho que os alunos que vêm praticando por mais tempo tendem a ser mais duros e fazem movimentos muito estereotipados. Como uma pessoa vê a prática de outra? Que significado podemos encontrar na contínua repetição de movimentos da prática de waza?Eu me lembro de uma historia sobre Pablo Casals, um grande violoncelista que tocava (e rezava) pela paz mundial na época das guerras mundiais. Quando ele tinha 13 anos, ele encontrou as Suítes para violoncelo solo de Bach, algo em que ninguém tinha interesse naquela época, e começou a tocar essas suítes todos os dias. Como as suítes de Bach consistem em seis movimentos, ele tocava uma por dia, e portanto, tocava cada movimento pelo menos uma vez por semana. Ele continuou essa prática diariamente até morrer aos 96 anos de idade. "Era como uma oração em minha casa," ele dizia. Acho que ele purificava sua mente primeiro tocando uma das suítes de Bach, e assim, energizado, ele podia fazer suas maravilhosas performances. Acredito que as performances criativas de um gênio como Casals são o resultado de uma “liberação da mente e do corpo", a qual ele atingiu através de sua incessante busca por uma prática básica. Apesar das diferenças entre a musica e o Aikido, eu realmente fui inspirado por essa historia, e sinto que existe nela alguma coisa importante para mim, enquanto eu persigo a prática do Aikido através de minha vida. Ueshiba Morihei, o Fundador do Aikido, em seus últimos dias, às vezes aparecia no Hombu Dojo e perguntava ao Shihan que estava no comando naquele momento, "O que você está ensinando agora?" O Shihan respondia que estava demonstrando shiho-nage, e o Fundador respondia, "O que é shiho-nage?" Em sua prática o Fundador demonstrava seus waza de forma livre, frequentemente fazendo a mesma técnica de varias formas diferentes, dizendo "Agora, faça desta maneira” e "Desta vez, faça assim". Ele costumava dizer que o Aikido é o caminho do Kanagara. Minha compreensão do caminho do kanagara é ser e agir de uma maneira natural. Eu acredito que o Fundador era sempre natural ao agir contra o ataque do oponente e produia seu waza para isso. Apenas a liberação da mente e do corpo podem capacitá-lo para utilizar totalmente seu corpo, livre do preconceito mental de que o waza deva ser feito de uma maneira especifica. Manter o que é básico, ser criativo e agir de maneira natural, isso é a liberação do corpo e da mente que Casals e Morihei atingiram. Vamos segui-los?

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Samurais



O termo samurai corresponde à elite guerreira do Japão feudal. A palavra samurai vem do verbo Saburai, que significa "aquele que serve ao senhor". A classe dos samurais, dominou a história do Japão por cerca de 700 anos, de 1185 à 1867. E ao longo desse período, os samurais exerceram diferentes funções em determinadas épocas, passando de duelistas à soldados de infantaria da corte imperial, equipados inclusive com armas de fogo.
No início, os samurais realizavam atividades minoritárias tais como, as funções de cobradores de impostos e servidores da corte imperial. Com o passar do tempo, o termo samurai foi sancionado e os primeiros registros, datam do século X, situando-os ainda como guardiões da corte imperial, em Kyoto e como membros de milícias particulares a soldo dos senhores provinciais. Nessa época, qualquer cidadão poderia tornar-se um samurai. Este cidadão por sua vez, teria que se engajar nas artes militares para então, por fim, ser contratado por um senhor feudal ou daimyo, mas enquanto isso não acontecia, esses samurais, eram chamados de ronin.
Na Era Tokugawa (1603), quando os samurais passaram a constituir a mais alta classe social (bushi), não era mais possível à um cidadão comum, tornar-se samurai, pois o título "bushi", começou a ser passado de geração em geração. Só um filho de samurai poderia tornar-se samurai e este tinha direito a um sobrenome. Desde o surgimento dos samurais, só estes tinham direito a um sobrenome, mas com a ascensão dos samurais como uma elite guerreira sob os auspícios da corte imperial, todos os cidadãos passaram a ter um sobrenome.

A partir desta época, a posição do samurai consolidou-se como um grupo seleto da sociedade. As armas e armaduras que usavam eram símbolos de distinção e a manifestação de ser um samurai. Porém para armar um samurai era necessário mais que uma espada e uma armadura. Parte de seu equipamento, era psicológico e moral; eram regidos por um código de honra muito precioso, o bushido (caminho do guerreiro), no qual a honra, lealdade e coragem eram os princípios básicos. A espada era considerada a alma do samurai. Todo bushi (nome da classe dos samurais), portava duas espadas presas ao Obi (faixa que segura o quimono), o katana (espada longa - de 60 a 90 cm) e wakisashi (de 30 a 60 cm), essas espadas eram o símbolo-distintivo do samurai.

Os samurais não tinham medo da morte, que era uma conseqüência normal e matar fazia parte de suas obrigações. Porém, deveriam morrer com honra defendendo seu senhor, ou defendendo a própria reputação e o nome de seus ancestrais. Se viessem a falhar ou cometessem um ato de desonra para si próprio, manchando o nome de seu senhor ou familiares, o samurai era ensinado a cometer o Harakiri ou Seppuku, ritual de suicídio através do corte do ventre.

Se um samurai perdesse o seu Daymio (título dado ao senhor feudal, chefe de um distrito) por descuido ou negligência na hora de defende-lo, o samurai era instruído a praticar o harakiri. Entretanto, se a morte do Daymio não estivesse relacionada à ineficiência ou falta de caráter do samurai, este se tornava um ronin, ou seja, um samurai que não tinha um senhor feudal para servir, desempregado. Isto era um problema, pois não conseguindo ser contratado por outro senhor e não tendo quem provesse seu sustento, freqüentemente tinha que vender sua espada para poder sobreviver ou se entregar ao bandidismo.

Nos campos de batalha assim como em duelos, os combatentes enfrentavam-se como verdadeiros cavalheiros. Na batalha, um guerreiro costumava galopar até a linha de frente inimiga para anunciar sua ascendência, uma lista de feitos pessoais, bem como as façanhas do seu exército ou de sua facção. Depois de encerrada tais bravatas é que os guerreiros atacavam-se. O mesmo acontecia num duelo. Antes de entrar em combate, os samurais se apresentavam, reverenciavam seus antepassados e enumeravam seus feitos heróicos para depois entrarem em combate.


Fora do campo de batalha, o mesmo guerreiro que colhia cabeças como troféu de combate era também um fervoroso budista. Membro da mais alta classe, empenhava-se em atividades culturais, como arranjos florais (ikebana), poesia, além de assistir a peças de teatro nô, uma forma de teatro solene e estilizada para a elite e oficiar cerimônias do chá, alguns se dedicavam a atividades artísticas tais como a escultura e a pintura.
O estilo de vida e a tradição militar dos samurais dominaram a cultura japonesa durante séculos, e permanecem vivos no Japão até os dias de hoje.



domingo, 1 de novembro de 2009

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

desenhos de pegadas


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quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Budo

Em um país atormentado durante muito tempo por guerras e conflitos, os samurais desenvolveram um rigoroso código ético não-escrito, conhecido como bushido, que fornecia parâmetros para se viver e morrer com dignidade. Hoje em dia, em um Japão mais seguro, este código de conduta desenvolveu-se para uma filosofia de vida, o Budo.

Filosofias do Budo
As filosofias do budo, foram escritas por famosos Kendo-kas e mestres zen tais como Miyamoto Musashi, Yagyu Munenori, Sekishusai, Soho Takuan e muitos outros, a cerca de 500 anos atrás. Budo pode ser traduzido como caminho das artes marciais, bu significa "marcial" ou "militar" e do "caminho". Todas as artes marciais japonesas são chamadas de budo, quando estas possuem conotação filosófica. Na idade média (Sengoku-gidai), principalmente em seu crepúsculo, surgiram grandes gênios da luta. Através das experiências vividas, eles se preocupavam em manter, mesmo em época de paz, o Ken-no-kokoro, o espírito da esgrima, considerado o alicerce do bushido (caminho do samurai), o qual desenvolveu-se em conjunto para a formação humana com ken (espada).
O homem não consegue viver em sociedade usando somente sua força animal ou instinto. Surgiu então um apoio mental, recorrendo-se à pratica do zen (método que dá equilíbrio mental). O Kendo chegou a um alto nível de perfeição, pois "ken-no-miti", o caminho da esgrima, é a meta de formação do samurai, favorecendo inclusive na era Tokugawa, o controle e o aprimoramento ao máximo da força mental e das técnicas. As lutas de Kendo permitiram enfrentar adversários fisicamente maiores com possibilidades de vence-los, impondo a paz e a disciplina, mostrando assim que já naquela época, os nobres procuravam aprimorar a mente e o corpo.

Objetivos da prática do Budo
Em resumo, deve-se a pratica do budo, a tarefa de contribuir na evolução do homem, ajudando-o a enfrentar e encarar a realidade com energia e coragem. A meta é descobrir o caminho de cada ser humano dentro das suas limitações e possibilidades. O homem, em sua evolução física e espiritual passa pelo estágio primário, secundário, atingindo um nível superior. Esta busca de perfeição deve ser o caminho da vida, que a cada dia se aprimora. Esta escolha do caminho permite ao homem viver, sentir, perceber, aperfeiçoar-se, enriquecendo-se até a morte.
A percepção atua, de acordo com o grau de sensibilidade, por meio dos órgãos dos sentidos, levando a diferentes reações e comportamentos. Além desses valores perceptivos, existe a riqueza espiritual que se manifesta pelo grau de emoções, satisfações e podem conduzir a verdadeira felicidade. Esta energia espiritual pode levar a um magnetismo favorável na personalidade e à formação de um alto grau de cultura do homem. O instrumento para o caminho da vida é a técnica que dá ânimo, motivação e estímulo. Para, utiliza-la, o homem aperfeiçoa sua habilidade e seu talento mantendo um bom controle do físico e da mente. Aqui, talvez esteja o verdadeiro caminho da vida.

continuação Budo

O que vem a seguir, é um profundo tratado filosófico sobre esta proposta milenar do budo, baseada em obras de grandes mestres do passado. Tais textos permitem ao leitor, ter um vislumbre de como deve comportar-se um guerreiro diante de uma situação de risco, seja na vida cotidiana ou em competições esportivas por exemplo, através do treinamento físico, mental e espiritual.
1. Preparo mental
2. Ki, Shin e Tai
3. Postura durante a luta
4. Como olhar durante a luta
5. Formas de lutar
6. Desequilíbrio Mental
7. Gritos de Guerra
8. Mente em "Ken" e "Tai"
9. Ouvir o som do vento e da água
10. A água é o espírito real e o gelo é falso
11. A vitória completa pode ser sua derrota completa
12. Vencer com "Ação Energética"
13. Ato de prudência
14. Takekurabe
15. O segredo das técnicas
16. A importância do treino e seus reflexos
17. A luta
18. Quem é bom no zen é bom na luta?



Preparo mental
O Budo diz: o estado mental deve ser igual ou inabalável na hora da luta como nas horas normais da vida cotidiana. A mente deve ser livre, clara, ampla e equilibrada. Não pode se tornar tensa e nem totalmente relaxada, sem se prender a nada, e sim, calma tranqüila; a vontade, não parando por nenhum instante.
Quando fisicamente se está calmo (parado, estático) a mente deve ser inversa, isto é, em estado de alerta. Quando o corpo está em forte movimento, o espírito deve manter-se calmo, como em dias normais. Evitar que o físico e a mente sejam arrastados ou influenciados um pelo outro. Não se preocupar demasiadamente com seu próprio corpo e nem se distrair ocupando seu pensamento com assuntos banais, mas evitar que o adversário perceba sua meta real na luta. Sua mente não deve se tornar turva, para que possa captar a imagem correta e conduzir o seu pensamento a uma posição mais nobre e instantânea.
Pesquisar cada vez mais no sentido de aperfeiçoar e lapidar o espírito, aumentando cultura e conhecimento. Cultivar a força de vontade, conhecendo o bem e o mal, o correto e o incorreto. Conhecer e assimilar as mais variadas modalidades de lutas e técnicas com a própria experiência, não se deixando iludir. Tudo isto deve ser praticado sempre, para poder corresponder instantaneamente quando for solicitado nas horas de necessidade ou grande ocupação, pois isso não se conseguirá aprender em curto espaço de tempo.




Ki, Shin e Tai
Ki (poder ou força que dá ação ao homem mentalmente). Energia não mecânica.
Shin ou Kokoro (coração ou sentimento)
Tai (força do corpo, inclusive as técnicas).
Ki - É uma qualidade que o homem deve adquirir, da qual origina toda a força e ação. Pode-se também definir como uma energia baseada no controle mental ou psicológico. É possível fortalece-la infinitamente, com a prática do Budo, auxiliada pela força de decisão. "Ki" se consegue através de treino consciente, no qual se adquiri confiança e experiência. Quando o "Ki" do homem une-se ao da natureza (leis naturais) surgirá uma força infinitamente grande. O domínio e o uso do "Ki" se consegue ampliar mais que 100% da própria capacidade, possibilitando maior proveito na vida cotidiana, no modo de agir e pensar. A energia hidroelétrica é um exemplo de união entre o homem e a natureza. Miyamoto Musashi quando adolescente, num dos duelos que travou, enfrentou um adversário fortíssimo, profissional de esgrima, conseguindo derrota-lo aproveitando a queda de rochas como fator surpresa. Este é outro exemplo de união homem-natureza.
"Shin" ou "Kokoro" (sentimentos) - Também se deve observar, utilizar e fortificar os sentimentos, como objetivo de treino. Tentando cada vez mais lapida-los ao alto grau de formação espiritual.
Na união do "Ki" e do "kokoro" surgem sentimentos naturais: a nobreza, lealdade, coragem, honra, responsabilidade, etiqueta, etc.
"Tai" (corpo) - O corpo deve ser forte, rápido, flexível, resistente, rico em reflexos, assimilando todas as modalidades de técnicas. Uso total do corpo, descarregando as agressividades e tensões nervosas acumuladas.
O Budo exige muita disciplina durante o período de treinamento, tanto no início, como no término da luta, devendo-se comportar com rigorosa etiqueta em suas normas. Seu treinamento não visa apenas a vitória numa luta ou seu orgulho pessoal e sim um melhor estado físico, uma vida cotidiana mais satisfatória, a preparação para enfrentar qualquer problema.
Durante a luta deve-se encarar com grande importância a distância em relação ao oponente, além da velocidade, técnica e equilíbrio no ataque e defesa, devendo-se adquirir inicialmente, de forma concreta a base ou fundamento correto na sua modalidade esportiva, garantindo assim um bom alicerce em sua formação.



A postura durante a luta
Falando em postura, alguns mestre observaram durante a luta o comportamento dos animais selvagens e concluíram, por exemplo, que um gato quando enfrenta um adversário, curva a coluna, demonstrando sua aparência bem maior, para impressionar o oponente e proteger-se contra agressões.
Segundo Musashi, o homem é um ser superior e diz o seguinte: "kamae" existe, mas também deixa de existir, portanto, não é recomendável ficar preso ou ocupado com uma posição, pois o objetivo é derrotar o adversário e a sua técnica. Deste modo pode-se dizer que existe ou não Kamae, pois se altera de acordo com o oponente, o local, a situação, podendo ser tomada a forma mais adequada e não perder o objetivo principal, que seria derrotar o adversário. Portanto, havendo a necessidade de utilizar maiores variedades de ataques e contra-ataques, não se prender a isto e sim fixar o pensamento num único objetivo, que é a maneira para dominar o oponente. Sem isso, nunca poderá derrota-lo.
Diz um provérbio sobre treinamento: "Hoje venci o eu de ontem. Amanhã vencerei o meu interior e no futuro vencerei o meu superior".
"Kamae" - formas ou posições de lutar que cada lutador possui e já conhece. No entanto, qual seria a posição ideal? - Musashi diz o seguinte: seu rosto deve manter-se firme, a cabeça é o centro de gravidade do corpo, deve-se manter equilibrado, sem abaixar ou erguer, sem torcer ou inclinar. Seu olhar é firme, cujo movimento deve ser calmo e estável. Não é recomendável contrair a testa exibindo rugas, admitindo-se estas entre as sobrancelhas e ao início da linha do nariz. As vistas devem piscar menos e diminuir o angulo de abertura dos olhos. Sua fisionomia é tranqüila, a linha do nariz normal, contraindo levemente o pescoço para endireitar a posição da cabeça; do ombro até ao longo do corpo seus tônus ou tonificações musculares são uniformes.




Como olhar durante a luta
"Seus olhares devem ser amplos e maiores em todos os sentidos"
"Kam" significa ver o "conteúdo" e será observado em primeiro lugar para notar a real qualidade das coisas. Depois vem "Kem", que significa olhar seus movimentos superficiais ou estéticos.
Olhar, ler e compreender superficialmente os movimentos distantes e observar, enfrentar e saber os objetivos reais dos movimentos próximos. Ver e entender o "conteúdo", evitando a influência das atitudes estéticas ou aparências. Nas lutas de mais de um adversário, deve se olhar os lados e arredores, sem movimentar os olhos.
Busque resolver os problemas mais necessários em primeiro lugar, sem esquecer dos secundários. Na movimentação ou na forma de execução, não estacione ou pare. Existem sentidos e valores que progridem e se alteram. Quando parar significa a morte, não parar significa a vida. A água em movimento não estagna nem putrefaz. Qualquer treino deve ser pesquisado continuamente possibilitando alterações e progresso.




Formas de lutar
Assim, através dos treinos, adquirir e assimilar as cinco formas de luta e todas as técnicas. O corpo aumenta sua flexibilidade, tomas decisões corretas e obtém o ritmo certo, facilitando os reflexos e impulsos. No inicio, vence um adversário, depois dois, três e muitos outros, aprendendo o certo e o errado na luta e, gradativamente, começando a perceber seu real objetivo.
Não se deve apressar e nem precipitar nos treinos e sim conhecer vários tipos de adversários, inclusive o preparo mental deles, alcançando essa meta com as próprias experiências vividas.




Desequilíbrio mental
São várias as causas da perda de equilíbrio mental: trauma psicológico, no caso de perigo, situações imprevistas, dúvidas, emoções descontroladas, acidentes, medo, etc. que podem influenciar o adversário e também a si próprio. Portanto, é muito importante, principalmente durante uma luta, enfrentando o oponente a frente, a exigência e necessidade do maior controle do seu estado psicológico. Aquele que conseguir esse controle perante seu atacante, já terá uma grande vantagem, possibilitando uma vitória com relativa facilidade. Assim, para abalar o estado mental do adversário é preciso citar situações, como golpes falsos, etc., utilizando ao máximo os recursos e conhecimentos adquiridos através de pesquisas profundas, as quais são necessárias. Conseguindo desequilibrar psicologicamente o adversário, este torna-se inseguro e abalado, perdendo o controle físico.




"Kiai" (gritos de guerra)
O 'Kiai' pode ser aplicado em três momentos: inicial, durante e final. Os gritos de guerra servem para aumentar, acelerar e expor a força de ação do homem. Portanto podem ser aplicados contra incêndios vendavais e as fortes ondas marítimas, para criar coragem e energia para enfrenta-los.
Na luta individual, para colocar o adversário em movimento, o grito antecipa os golpes. não é necessário utilizar o grito, simultaneamente com os golpes. No decorrer da luta, ele servirá para incentivar numa situação, numa onda quente a correnteza da vitória (e este também é baixo, forte e profundo). Usa-se também como agente animador numa torcida. Deve-se tomar precauções ao gritar, pois se o grito for usado fora do ritmo e tempo ou em ocasiões impróprias, poderá surgir como contra efeito, tornando-se prejudicial.




Mente em "Ken" (ataque) e "Tai" (defesa)
"Ken", significa atacar violentamente e vencer com enérgica iniciativa, isto é, como uma explosão total de forças. "Tai", esperar o ataque do adversário, mas com bastante precaussão, estando física e mentalmente pronto para o mesmo, refletindo instantaneamente e não apenas para defender-se logo. Neste caso, o reflexo deve ser como "antecipar a iniciativa do ataque do oponente".
Pode-se colocar o corpo em "ken" (ataque) e a mente em "Tai" (defesa), ou vice-versa. Isto pode ser chamado como alternância da mente e do corpo em Ken e Tai. A razão disto está em não deixar que a mente e o corpo estejam em Ken (ataque), porque surgirão algumas falhas no descontrole de um deles. É como se fosse um automóvel com excesso de velocidade e o motorista em estado mental agitado, havendo assim uma grande possibilidade de perigo. Sendo ao contrário o corpo e a mente em Tai, simultaneamente, a luta tornar-se-á monótona e será surpreendido pelo adversário, o que também não é recomendável. Então o ideal seria o controle harmonioso entre o corpo e a mente sempre em alternância.




Ouvir o som do vento e da água
O homem pode se dividir em duas partes: parte externa ou superficial e interna ou mental. O controle ideal seria semelhante ao do Texto anterior, mas também pode dizer-se que, para um lutador, sua parte externa deve colocar-se em estado calmo e a parte interna em estado dinâmico e ativo.
Yagyu Tajimano kami diz: "O vento em si não emite nenhum som. Mas, se vier a soprar mais baixo e em contato com diversos tipos de obstáculos, emite vários tipos de sons. A água quando cai, não tem som, mas ao chocar-se contra algum obstáculo, produz diversos sons. Assim, deve-se reagir calmamente de acorod com as circunstâncias e necessidades. Deve-se manter a calma superficialmente, porém, no interior deve-se se estar em ação para se aprimorar."
No Budo, o corpo em movimento nervoso não é recomendável e também se deve evitar a influência mental pela movimentação superficial.
Existem os termos IN, que se pode traduzir como pólo negativo, lua, noite, dorsal e YOU, pólo positivo, Sol, dia, facial. Ambos são necessários para compreensão de tudo que nos cerca. Devem ser ajustados equilibradamente, simultaneamente com a sua parte externa e interna do corpo. Quando a sua parte interna for YOU (ativa), a parte externa é IN (calma) ou virce-versa, deverá sempre haver um equilíbrio entre a mente e o corpo.
O "Ki" pode ser expresso na alegria, no estado de atenção, de alerta de vontade, nos anseios, etc. e assim se pode trabalhar com o KI (energia de ação) em grande uso no seu interior e com cuidado e precaução no exterior ou, no interior calma e exterior ativo. Expondo o KI desse modo, tudo isso deve ser natural como o amanhecer e o anoitecer.
Assim, Ken (ataque), Tai (defesa), Dou (movimento) e Sei (parado) devem ser ajustados harmonicamente e alternadamente no seu interior e exterior do corpo ou inversamente.
Um pássaro d'água que flutua sobre a mesma, aparentemente está calmo, mas por baixo da superfície da água está utilizando cuidadosamente suas patas a procura de iscas. Existem duas faces opostas chegando à perfeição, cujo trabalho do corpo no seu íntimo e no exterior se torna uma ação conjunta, perfeitamente livre e espontânea. Jubei Yagyu analisando o provérbio acima citado, diz: "Durante a luta tenha sua mente tranqüila consigo mesmo, até possa ou consiga ouvir o sussurro do vento e da água."




A água é o espírito real e o gelo é falso
O espírito real quer dizer: conseguir vencer, analisar e agir de modo correto do seu estado mental normal, o que não fica preso a qualquer coisa.
O espírito falso, ao contrário, se torna preso a um pensamento isolado. Agora, se seus espíritos reais se concentrarem apenas num lugar, tornando-se sólido, transformar-se-ão em espíritos falsos. Deste modo, não poderá reagir naturalmente contra os diversos tipos de problemas que surgem ao redor.
A água e o gelo são semelhantes, mas não iguais, pois com o gelo não se pode lavar. Derretendo-o e permitindo que se escoe livremente em todas as direções, torna-se então utilizável.
Com a mente acontece o mesmo, não se deixar prender, pois ficando sólida, perde a flexibilidade e não poderá ser utilizada. Derretendo-a e permitindo que se escoe por todo seu corpo, onde quer que seja, em todo lugar, livremente, assim se pode dizer que é o espírito real. Quando a mente fica presa por uma flor vermelha, esquecendo-se do tronco, raízes e folhas, perde-se a visão do conjunto. O homem, as vezes, refletindo sobre suas atos, logo percebe porque estava tão nervoso e descontrolado por assuntos tão banais. Isto quer dizer que a mente estava presa e sólido.




A vitória completa pode ser sua derrota completa
Existe um provérbio que diz: "Conhecendo-se o adversário e conhecendo-se a si próprio, pode se lutar cem vezes que não haverá perigo. Não conhecendo o adversário, porém conhecendo-se a si, às vezes se pode ganhar ou perder. Mas, se não se conhece o adversário e nem a si próprio, nunca se conseguirá vencer."
É necessário admitir corajosa as próprias falhas o que poderá ser a causa da derrota. Não exceder sua capacidade e nem se rebaixar. O excesso de orgulho e outras falhas acontecem devido à falta de visão realista, coragem e cultura. É preciso conhecer o seu "eu" fraco e o forte para adquirir a vitória.




Dominar com "Iguem" (Kuraidori) e vencer com "Ação energética" (Ikioi)
"Iguem" ou "Kuraidori" significa que o homem domina o adversário não pela técnica da luta e nem pela força, mas sim por uma espécie de energia irradiada que se manifesta pelo grau de formação espiritual, cultural e do caráter do indivíduo. "Iguem" não se altera por influência externa ou circunstâncias, porque isto é uma qualidade adquirida do homem.
Com o "Iguem" e uma vez que o individuo tomou a posição de luta (kamae) que é a posição realmente perfeita, exercendo uma pressão dominadora contra o oponente, sem a necessidade de movimentos, sua atitude nunca será influenciada ou abalada pelos movimentos adversário.
"Ikioi" é um movimento ou ação bastante forte e esmagadora, além de dominadora, contra o adversário.
"Iguem" é calmo, mas no íntimo contém mil variações e alterações de reflexos, prontos contra qualquer tipo de ataque do adversário. Junto com o movimento "Ikioi", cuja ação é esmagadora, anula as mil tentativas do oponente.
Assim diz-se: Enfrente o adversário com Iguem e vença com o Ikioi. São as duas coisas num objetivo só. Dentro de Iguem, contém Ikioi e vice-versa. Quando apresentar Iguem forte, não temerá o oponente e nem terá dúvidas de si próprio.




Ato de prudência e seu procedimento diário
Para expor com perfeição toda capacidade de conhecimento, deve-se agir de modo prudente, habitual e constante, em qualquer circunstância. A maioria das técnicas, atos fenomenais e lendários transcritos, foram baseados na dedicação e seu melhor controle mental e não com o auxílio de milagres. Mesmo possuindo técnicas fenomenais, caso for surpreendido numa hora de distração, não conseguirá realizar um trabalho consciente. Portanto, na hora de sentar-se, verifique discretamente ao seu redor, em todos os sentidos e direções, de modo a prevenir-se contra qualquer incidente. Também, quando estiver perto de uma porta, observar cuidadosamente, preparando-se contra o perigo.
Assim como no exemplo citado acima, deve-se ser prudente no modo de agir, de procedor, preparando-se física e mentalmente para estar apto a qualquer situação, através do seu treino e prática constante. Só assim conseguirá uma reação satisfatória em qualquer ambiente.
Para uma pessoa bem treinada no seu modo de proceder, com o olhar, pode transformar seu olhar em um golpe que se denomina "Mitsume", isto é, um olhar relâmpago e dominador, em que o adversário perde suas reações e reflexos, sendo que, esta falha, numa fração de segundo, poderá ser uma das causas de derrota. O gato, com seu olhar, consegue paralizar o rato e este esquece-se das pernas para fugir, preocupando-se com o olhar fulminante do gato. Os acontecimentos imprevistos podem ser diabólicos e fatais, apresentados sob mil variações e quem não estiver preparado, mesmo possuindo boas técnicas, poderá falhar na união da técnica, mente e corpo que refletem inconscientemente as suas capacidades com perfeição.




Takekurabe
Takekurabe significa aferição de altura. Isso explica o ato de aproximar-se ou chocar-se contra o adversário, para evitar de tomar uma postura rebaixadora. Em qualquer situação, para penetrar no adversário, é necessário que o corpo se alongue, se estenda ao todo que fique mais solto, à vontade, cheio de reflexos, evitando que se torne encolhido ou espremido. Assim, deve-se enfrentar o adversário, corajosamente, frente a frente, dominador, exercendo pressão no adversário e com força, como se fosse numa aferição de altura.




O segredo das técnicas
A luta não é magia, portanto, não há necessidade de esconder certas técnicas, fazendo segredo. O bom método seria transmitir as técnicas mais fáceis de assimilar, evoluindo para as mais difíceis, juntamente com as teorias mais simples de adaptação e, pouco a pouco, de acordo com o progresso do indivíduo se aprofundando nos assuntos mais complexos. Na luta, as vezes, é melhor utilizar as técnicas fenomenais, não só por aquele que está com o nível técnico em condições de entender do assunto e ter capacidade para utiliza-las com grande aproveito, como por aquele que ja é um mestre.
No Budo, o mestre pode se orgulhar, mesmo que ensine tudo que conhece. Ninguém consegue superá-lo porque existe constante progresso e aprimoramento entre professor e o aluno. Não merece respeito, aquele que leva o budo, exibindo aos leigos os seus mil e um manejos, impressionando-os. O budo não é show, portanto deve ser modesto e servir para o aperfeiçoamento de algo mais na formação de sua personalidade. Possuir bons princípios e confiança, evitando tomar o caminho malévolo e a auto-destruição consequentemente.




A importância dos treinos e seus reflexos
Existe uma tendência no campo esportivo de que as teorias antecipam-se às praticas em geral. As posições de lutas são mais fáceis de assimilar do que as movimentações na luta. Estas tendências ocorrem principalmente quando o adepto tenta se aperfeiçoar fugindo de sua prática e permanecendo longe das experiências vividas.
Os reflexos e as técnicas instantâneas não nascem com os pensamentos ou cálculos e sim através do fenômeno natural que é a maior repetição e a sedimentação constante dos treinos e estes se revelam de um modo mais econômico e perfeito contra diversas formas e tipos de ataques. O treino deve objetivar a vitória, descobrir o caminho real da vida e com persistência no treino, o corpo adquire suas teorias. Através dos treinos, atingindo certo nível, consegue-se diminuir os problemas e tensões que abalam a mente, que trabalham em conjunto e unidade.
Os movimentos na luta tornam-se automáticos e inconscientemente reagem contra qualquer situação em que se encontrem de modo tranqüilo. Toda esta automatização se adquire com o aprimoramento da pesquisa no treino e a dedicação, conseguindo ultrapassar seus ensinamentos, atingindo então o "Satori" (perfeição, iluminação) que não se aprende através de ensinamentos e isto se descobre com o próprio corpo.
Então surge a dúvida - como deve ser o seu treino para que as teorias não se antecipem às práticas? Isto, Yagyu esclarece através da denominação - "grau da lua e da água" (Suiguetsu-no-Kurai). A Lua reflete na água em diversas formas, por motivos de muito tipos de ondas influenciadas pelo ambiente, mas a imagem real é única. O indivíduo bem formado e equilibrado, mesmo de um ambiente sujo, não se contamina, em perfeito estado. É como uma jóia bem lapidada que mesmo dentro da lama, não perde o brilho. Porém, uma pedra não lapidada, a sujeira e a poeira facilmente aderem a ela. manter o estado mental em "Mushim", quer dizer não ficar escravizado por interesses e idéias confusas e também de mal conceito mental.
Não se define a imagem real do estado mental mas, pode concretizar-se, exemplificando como a água que não possui forma definida, se situando em qualquer recipiente, quer seja redondo ou quadrado, livremente. Não se deve preocupar somente com um conteúdo de treinamento. Assim nos golpes a aplicar, acompanham as técnicas, para as quais participam suas leis e princípios fundamentais. A força mental é a origem das técnicas e a forma ou base de lutar é a origem dos movimentos nos golpes. Através da lealdade consigo mesmo, consegue-se adquirir a vitória, mas com o engano e malandragem, a vitória vem raramente. Não se deve progredir com teorias emprestadas, fugindo das próprias experiências que vive.




A luta
Um estilo explica: quando enfrentar o adversário seriamente, em frente, surgem duas faces na mente. Uma é para vence-lo e dominá-lo, outra é o medo tentando fugir da situação, pois a outra é uma coragem falsa e imposta. Aceitar esta realidade e treiná-la para fortifica-la cada vez mais se faz necessário para ter o domínio perfeito das técnicas, inclusive o seu físico. A essência do budo é utilizar ao máximo o trabalho fenomenal da mente, pesquisando-a, sedimentando-a gradativamente para o melhor.
Um cego aproxima-se da cobra sem medo, pois ele não a vê e não conhece o perigo. No início do treino, surge uma etapa em que se enxerga o medo e não consegue se movimentar, mas com persistência, ultrapassando essa barreira, aprede-se a se afastar do perigo.




Quem é bom no zen é bom na luta?
Seus objetivos são distintos, mas muitos falam de seu relacionamento e se confundem. Zen é para ultrapassar o mundo da vida ou da morte, para adquirir a paz espiritual ou mental, conseguindo assim a mente clara e o bom raciocínio, anulando todos os problemas que nos cercam. Deste modo, estando numa situação, no meio de mil adversários, mesmo o seu corpo sendo triturado, consegue manter o estado mental consciente. Mas este estado mental não serve para livrá-lo da morte. Mas, sim, para não temê-la.
Portanto, a diferença no budo seria afastar ou defender-se da morte com auto-confiança. Assim, o estado mental em equilíbrio pode enfrentar e resolver os problemas de modo mais conveniente e útil para si.
Concluindo, só o treino mental não basta, é necessário fortalecer a técnica através do corpo, evitando desta maneira, a influência maléfica. Assim a mente nunca será ameaçada.