sábado, 31 de março de 2012

A importância do treinamento por Kisshomaru Ueshiba


A única maneira de apreender o significado do Aikido e de obter algum benefício, palpável ou não, é praticar realmente a arte. A maioria dos praticantes passou por um processo assim: começam com dúvidas e perguntas, são iniciados na prática e gradualmente se familiarizam com o método e a forma do Aikido. Mais tarde, sentem sua irresistível atração, e por fim, obtêm certa compreensão de sua profundidade imensurável. Quem tenha percorrido este ciclo terá aprendido várias coisas sobre o Aikido que o tornam uma arte marcial singular.
Em primeiro lugar, a pessoa se surpreenderá. Diferentemente da aparência suave vista nas demonstrações públicas, o Aikido pode ser realmente duro, vigoroso e dinâmico, com chaves de pulso fortes e golpes diretos (atemi). A despeito do que poderia supor, o Aikido dispõe de várias técnicas devastadoras, especialmente as destinadas a desarmar e a dominar o inimigo.
Em seguida, ela ficará chocada ao descobrir o quanto é complicado e difícil, mesmo no nível de principiante, executar as técnicas e movimentos básicos, tais como as quedas (ukemi), o distanciamento adequado (ma ai), a entrada (irimi), e outros movimentos de corpo (tai sabaki). O fato é que o corpo todo, não apenas os braços e as pernas, deve mover-se com rapidez, vigor e potência. É necessário um grau extraordinário de concentração mental e de agilidade, de equilíbrio e de reflexos para atuar com suavidade e rapidez.
Perceberá também a importância do controle da respiração, que inclui não somente a respiração normal, mas algo mais que se conecta com a energia ki. Este domínio do poder de pulsação é a base para a execução de qualquer movimento e garante a continuidade do fluxo dos movimentos. Além disso, está intimamente relacionado com a filosofia do Budô desenvolvida por mestre Ueshiba, como veremos adiante.
Por fim, à medida que o aluno avança, ficará admirado com o incontável número de técnicas com suas variações e aplicações, toda caracterizadas pela racionalidade e economia. Só depois de experimentar a complexidade dos movimentos do Aikido é que ele terá condições de apreciar o valor central do ki, tanto o individual como o universal. E então começará a sentir a profundidade e o refinamento do Aikido como arte marcial.
Em síntese, somente através de um treinamento efetivo no Aikido é que podemos compreender a plenamente a dimensão essencial do Budô — o treinamento constante da mente e do corpo como disciplina básica para os seres humanos que trilham o caminho espiritual. Só então podemos compreender completamente a recusa de competições e torneios de Aikido e o motivo que justifica as demonstrações públicas como sendo uma amostra de treinamento constante, e não de exibição de ego.

por Kisshomaru Ueshiba, o 2º Doshu do Aikido
Trecho do livro “O Espírito do Aikido”

Reflexão


"Tenhais confiança não no mestre, mas no ensinamento.
Tenhais confiança não no ensinamento,
mas no espírito das palavras.
Tenhais confiança não na teoria, mas na experiência.
Não creiais em algo simplesmente porque vós ouvistes.
Não creiais nas tradições simplesmente porque elas têm sido mantidas de geração para geração.
Não creiais em algo simplesmente
porque foi falado e comentado por muitos.
Não creiais em algo simplesmente porque está escrito em livros sagrados;
não creiais no que imaginais, pensando que um Deus vos inspirou.
Não creiais em algo meramente baseado na autoridade de seus mestres e anciãos.
Mas após contemplação e reflexão, quando vós percebeis que algo é
conforme ao que é razoável e leva ao que é bom e benéfico
tanto para vós quanto para os outros,
então o aceiteis e façais disto a base de sua vida."

Gautama Buddha - Kalama Sutra

sexta-feira, 2 de março de 2012

Entrevista com Isoyama Shihan-8 Dan  Antigo aluno do Fundador





Entrevista concedida à Stanley Pranin para o Aikido Journal Magazine - nº 119
Hiroshi Isoyama iniciou-se na arte do Aikido ainda criança, aos 12 anos de idade, no Dojo do Fundador Morihei Ueshiba, em Iwama. Ele é um dos poucos e raros indivíduos --- sendo o outro Morihiro Saito --- a ter tido contato com o Fundador durante seu período de "amadurecimento" do Aikido moderno. Isoyama é apaixonado por seu estudo do Aikido, e seu dinamismo é refletido em sua técnica explosiva. Hoje em dia aposentado após uma longa e distinta carreira na Força Aérea, Isoyama se dedica em tempo integral ao seu treinamento e a ensinar. Ele tem se tornado cada vez mais conhecido internacionalmente e tem freqüentemente viajado a outros países nos últimos anos.


O Aikido em Iwama, após a guerra.
Aikido Journal: Por favor, diga-nos como o senhor se iniciou no Aikido.
Isoyama Sensei: Foi lá pelo ano de 1949, que como você sabe, foi uma época muito difícil no Japão. Minha família dirigia uma hospedaria. Diferentes tipos de pessoas se hospedavam lá, incluindo membros da Yakuza e, devido a isso, achei que seria estupidez se eu não soubesse algum tipo de arte marcial. Aconteceu que o aiki Dojo (ainda não existia o nome Aikido, e o Dojo viria a se chamar "Aiki Shuren Dojo") acabara de iniciar aulas para crianças, por isso fui até lá com outras crianças da vizinhança para me inscrever. Eu tinha doze anos nessa época.
O O-Sensei ainda vivia em Iwama?
O-Sensei dava aulas todos os dias à tarde para as crianças.
Os ensinamentos eram os mesmos utilizados no Hombu Dojo em Tóquio?
Eu não sei como eram os treinos em Tóquio naquela época, mas ele costumava ir um a um a cada aluno e segurar em seus pulsos, e ensiná-los dessa maneira. Ele mesmo não fazia ukemis, mas ele fazia qualquer técnica que fosse, shomenuchi ikkyopor exemplo, para cada pessoa individualmente no tatami, enquanto os outros assistiam. Ele nunca deu explicações detalhadas
Não haviam tatamis nesse dojo, por isso os treinos eram muito doloridos. Por essa razão era muito difícil conseguir pessoas querendo treinar. Depois de muitos anos eles finalmente puseram tatamis no dojo, mas já estávamos treinando no chão de madeira por tanto tempo, que por um tempo tivemos problemas para nos ajustarmos a eles. Se você bater sua cabeça no chão de madeira fazia um barulho alto, mas a dor nunca penetrava a cabeça toda. Depois de colocarmos tatamis, a dor chegava completa. Naturalmente, a maneira de fazermos ukemi mudou quando passamos da madeira para os tatamis.
Quem estava no dojo nesse tempo, além de Sensei Saito?
Haviam pessoas como Takeo Murata, Sakae Shimada (hoje diretor da Federação da Prefeitura de Ibaragi), e Sachio Yamane. De qualquer modo, como eu disse, não existiam muitas pessoas treinando lá naquele momento. Também, Kunio Oyama, que mais tarde se tornou aluno do lutador profissional Rikidozan, e outras pessoas assim que estavam lá como uchideshi.
Eu vejo que você acabou se alistando na Força de Defesa Pessoal Japonesa.
Sim , eu me juntei a Força de Defesa Aérea Japonesa, e fui enviado a Chitose em 1958.
Você formou algum clube de Aikido em Chitose?
Sim, no início todos os meus alunos eram membros da Polícia Militar Americana, mas com o tempo foi me pedido pelo comandante do posto a ensinar aos membros da Força de Defesa Aérea Japonesa também. Lá eu também aprendi o Inglês, devido a necessidade.
Durante sua visita recente a Los Angeles, você ensinou em inglês?
Sim, inteiramente em inglês! Em que outra língua eu poderia?! [Risos].

Devido a muitos de seus alunos da Polícia Militar Americana serem fisicamente muito maiores que o senhor, o senhor teve que adaptar novas maneiras de fazer suas técnicas funcionarem neles?
Certamente. Praticar com pessoas assim é completamente diferente do que com pessoas comuns que são menores que você. Fazendo até mesmo Ikkyo contra um oponente muito maior é muito difícil, especialmente em termos de como se deve entrar e do timing que se deve usar. Treinar com pessoas assim era uma grande experiência, com a qual eu aprendi muito.
Minhas técnicas de kataguruma gansekiotoshi, por exemplo, começaram quando eu tentava ensinar koshinage. Quando eu tentava fazer koshinage em algumas das pessoas mais altas, percebi que eles passavam por cima de mim; não importando como eu fizesse a técnica, eu não conseguia projetá-los porque não importava o que eu fizesse, com a diferença de altura, meukoshi não ficava numa posição adequada na frente deles. Então, eu tive a idéia de colocá-los em cima de meus ombros ao invés de em cima de meus quadris, e foi assim que eu comecei a fazer essas técnicas. Eu não estava tentando ser bruto ou exibicionista, eu estava somente tentando fazer as técnicas funcionarem. A necessidade é a mãe da invenção!
Lá em Chitose, haviam muitos lutadores e boxeadores e afins, que vinham rir do que estávamos fazendo. Devido ao alistamento para a guerra, havia todo tipo de pessoas diferentes entre os militares Americanos. Normalmente, durante as aulas de Aikido, você entra e aplica sua técnica no oponente assim que ele está atacando, mas quando eu fazia isso, muitos deles reclamavam que ainda não estavam prontos; eles queriam que eu os deixasse que segurassem bem firme ou que me estrangulassem para daí eu ver se eu conseguia tentar aplicar alguma técnica. Normalmente nos treinos, o oponente vem atacar pela frente e em seguida se move em volta do nage até chegar por trás do uke, para assim impedi-lo e não dar chance para que ele lance um ataque completo. Mas isso não os convencia, por isso eles queriam primeiro me agarrar bem firme para poder me desafiar para eu tentar me livrar deles.
Em outras palavras, o senhor tinha que praticar sob as mais difíceis circunstâncias possíveis.
Havia um rapaz, um lutador de luta livre, que havia conseguido o sexto lugar nas Olimpíadas de Helsinki, que caía no chão e me agarrava por trás e me abraçava, de maneira que eu não conseguia mover minhas mãos e pés, e dessa posição me desafiava a tentar me mover. A única parte do meu corpo que estava livre era minha cabeça, então dei uma cabeçada para trás, quebrando a cartilagem de seu nariz com a minha nuca. Isso é proibido na luta livre, é claro, mas tais regras não se aplicam ao Budo. Ao atingir seu rosto, eu gritei e consegui uma abertura momentânea para sair. Eu disse a ele, "É assim que oBudo é!", e ele se convenceu. Esse tipo de coisa acontecia todos os dias...
Você conta aos seus estudantes Americanos sobre o Fundador, Morihei Ueshiba?
Sim. Eu até levei alguns deles até Iwama para conhecê-lo. Eles não acreditavam quando me viram sendo arremessado para todos os lados do tatami pelo O-Sensei. Eles diziam, "Como é que pode alguém como o senhor, que arremessa a todos nós tão facilmente, ser arremessado assim por um velhinho?!". Eu respondi, "Isso é o que eu queria saber!!" [risos]. Expliquei que o Aikido não tinha nada a ver com a idade da pessoa. Eles me perguntaram se eles próprios poderiam tentar segurar o O-Sensei, e um dos mais ávidos tentou e, no momento em que se levantou para a tentativa, foi imediatamente derrubado e imobilizado. Não conseguiam imaginar como puderam ser controlados daquela maneira; eles só sabiam que havia acontecido!.
A última vez que fui aos Estados Unidos, eu me encontrei com um daqueles antigos militares que haviam sido meus alunos. Eu não o via há mais de quarenta anos. Depois de chegar a Shodan ele voltou aos Estados Unidos, se formou pela Universidade de Boston e mais tarde foi oficial na Guerra do Vietnam. Após tudo isso, se juntou ao FBI onde, por vários anos, esteve envolvido com estudos das técnicas de domínio e imobilização, o que chamamos no Japão de "taihojutsu". Ele usou a Internet para me ajudar a procurar os outros que também haviam sido meus alunos naquela época. É maravilhoso que o Aikido construa relacionamentos dessa maneira. Mesmo que estejamos afastados por algum tempo, ainda existem maneiras para que eles voltem a você novamente.


Budo como uma corrente que flui sob o Aikido
Como você diria que sua ênfase na importância do Budo no Aikido se desenvolveu?
Por eu estar numa posição de ensino do Aikido, eu sinto que devo me manter orientado numa direção consistente. As pessoas praticam o Aikido por uma série de razões --- para se manterem em forma ou saudáveis --- mas é claramente o "Budo" que é a corrente fluente que existe por debaixo do Aikido. Não há problemas com as pessoas praticando Aikido por uma simples razão de os manter em boa forma, mas eu acho que eles deveriam ainda cultivar o tipo de vigilância constante que se deve Ter para se evitar dar aberturas aos potenciais oponentes. Esse é um aspecto oculto no Budo e de suma importância, e eu penso que ao se negligenciar ou dar pouca importância a isso em seu treinamento, resultará em uma grande divergência com o verdadeiro espírito do Aikido.
O pensamento do Fundador se modificou ao correr dos anos em que começou a ensinar o Aikido até o final de sua vida, por isso, naturalmente os tipos de movimentos que ele utilizava também se modificaram. Existem pouquíssimas pessoas que tiveram direto contato com ele durante essas várias décadas e, devido a isso, em muitos aspectos é como estória dos três homens cegos que apalpavam três partes diferentes de um elefante, dando descrições diferentes entre si sobre o que era um elefante. Nesse sentido, eu imagino se existe alguma pessoa capaz de entender a grandeza do O-Sensei em sua totalidade.
Algumas pessoas tiveram contato com o O-Sensei durante o tempo em que ele difundia o Aikido puramente como um Budo; outros somente começaram a aprender com ele quando seu pensamento evoluiu e ele enfatizava o Aikido como "um caminho para a harmonia"; outros ainda, estiveram com ele durante outros períodos de sua vida. Todos eles terão pontos de vista e interpretações diferentes, e eu acho que é impossível dizer que qualquer uma das interpretações seja a melhor que as outras.
Eu também acho que existem diferenças de acordo com e a idade do aprendiz. As pessoas mais jovens naturalmente procuram um tipo mais forte de Aikido, enquanto que os mais velhos podem Ter sido atraídos aos aspectos mais espirituais e harmônicos, e assim sendo, isso é o que cada um absorve dos ensinamentos do O-Sensei. Assuntos como esse tornam muito difícil de se falar do Aikido de uma maneira mais definitiva.
Como você sabe, o O-Sensei nunca escreveu muito sobre Aikido em livros, mesmo assim, algumas de suas técnicas estão gravadas no livro "Budo". Algumas vezes penso no porque de ele não Ter escrito mais sobre o Aikido, mas por outro lado, acho que compreendo: eu pensamento gradualmente foi evoluindo, e ele pode Ter sentido que qualquer coisa que ele escrevesse em seus anos de juventude, poderia acabar sendo potencialmente contraditório com seus pensamentos mais tarde. A mesma verdade existe em sua técnicas: se ele houvesse dito alguma coisa definitiva sobre elas em qualquer época, ele poderia acabar se contradizendo mais tarde em sua vida, devido a sua evolução.
Outra dificuldade que existe é a de diferentes pessoas que tendem a querer interpretar as palavras do O-Sensei em maneiras diferentes, mesmo que ele, na verdade, tenha dito a mesma coisa para todas elas. As pessoas então, tendem a expressar suas próprias interpretações como se tivessem absorvido tudo o que ele queria dizer e, por isso, os levam a outras variações, o que acaba causando eventuais desentendimentos.
Quando o O-Sensei ensinava, ele nunca dava nenhuma explicação detalhada em particular. Uma das razões era que muitas das pessoas que vinham treinar Aikido com ele, eram sempre pessoas de alto nível social, como oficiais militares, políticos, pessoas altamente graduadas de outras artes marciais, pessoas do setor financeiro, administradores de grandes empresas, e muitas outras pessoas importantes e respeitadas em seus ramos de negócio. Dar detalhes demais para pessoas assim, por exemplo, ensiná-los coisas como: "essa é a maneira correta de se curvar ao se cumprimentar" e coisas do tipo, seriam consideradas como humilhantes e ofensivas.
Durante o treinamentos, O-Sensei sempre se dirigia em linguagem respeitosa e educada aos indivíduos de alto nível na sociedade e a nós alunos comuns. Eu ficava muito comovido por essa atitude de interagir com as pessoas.
Um exemplo pode ser o debate sobre o atemi, que quase não existe mais como parte da maioria das técnicas de Aikido. Qual é o seu pensamento sobre o uso do atemi, de um ponto de vista de combate?
Fazer o atemi somente por fazer, resulta em nada mais do que uma forma vazia. Não há necessidade de se dar um atemi, a não ser que seu golpe é o tipo de golpe que terá um efeito real. Um atemi não tem que necessariamente resultar em um golpe fatal, mas deve ser capaz de causar um certo estrago real. Também, se você quiser pensar seriamente sobre atemi, você terá que pensar também sobre os chutes.
Karate, por exemplo, tem excelentes técnicas de chute e socos. Eu diria que a maioria dos movimentos do Karate é predominantemente em linha reta, enquanto que no Aikido tende-se a enfatizar os movimentos mais circulares ou esféricos. Ambos tem seus pontos fortes e deficiências, e eu não acho que você pode dizer incondicionalmente, que um é melhor do que o outro. Em todo caso, se você vai usar socos ou chutes como atemi no Aikido, você precisa pensar constantemente em como deve incorporá-los, de maneira que seja considerado o timing e outras características dos movimentos do Aikido.
A controvérsia das Armas
O uso de armas no Aikido é outro assunto em que existem diversos pontos de vista diferentes. O senhor acha que as armas fazem têm algum papel no treinamento do Aikido?
Eu definitivamente acho que elas têm. Técnicas como tachitori (técnicas de desarmamento de espadas) e jodori (técnicas de desarmamento de bastão), são incluídas como parte dos testes de dan, e as pessoas que somente fazem as técnicas com as mãos vazias, não serão capazes de demonstrar, serão?
Também, se você não tiver um forte comando das técnicas com armas, de maneira nenhuma você conseguirá responder corretamente se seu oponente estiver com uma arma. você acha que terá sucesso se um expert em kendo te desafiar a fazer otachitori do Aikido contra a espada dele? Ou se um praticante de Muso-ryu jo te dar a chance de tentar tirar o jo dele e desarmá-lo, você será capaz de fazer isso facilmente? Eu duvido.
Eu acho que as técnicas com armas são extremamente importantes, mas também acho que é perigoso praticá-las somente superficialmente; se você vai praticar técnicas com armas, deve praticar seriamente e por completo. Essa é uma das razões porque eu acho que não há necessidade de se praticar coisas como tachitori e jodori em tantas variações. Tantotori (técnicas de desarmamento de faca), também, é algo que eu pratiquei contra uma lâmina real, mas somente com algumas variações. Tudo o que você precisa é uma ou duas técnicas, e se você realmente as domina bem, daí eu acho que você estaria o melhor equipado que se poderia estar, para se defender contra tais coisas. É claro que, sempre que a situação envolver armas, sempre existirá um elemento de perigo.
Já que não podemos praticar com armas reais no dojo, nós usamos espadas de madeira (bokuto), mas se você quer tornar seu treino o mais eficiente possível, é necessário que você pense que a lâmina do bokuto é real, e não somente como um pedaço de pau. Isso inclui fazer seus ataques rápido e decisivos, cheios de intenção. você não será capaz de cultivar o grau correto de seriedade se você estiver cortando de maneira a facilitar o seu ukemi. É uma coisa muito boa manter esse tipo de coisa no fundo de sua mente, quando estiver treinando com armas.
Se diz freqüentemente que não existem confrontos no Aikido. Eu acho que existem várias dimensões de significado nisso, mas o O-Sensei disse uma vez, "A Vitória e a derrota são meramente relativos, no entanto o Aikido busca a força absoluta, e não relativa. Por isso, o Aikido é o treinamento diário de "vencer antes da luta começar".
Qual era a visão do Fundador em relação as técnicas com armas, em sua percepção? Por exemplo, de acordo com o Sensei Morihiro Saito, o Fundador treinava bastante com armas e consequentemente o Aikido do Sensei Saito contém muitas técnicas com armas. Por outro lado, outros apontam dizendo que o Fundador não ensinava com armas no Hombu Dojo, e até se zangava se alguém praticava com elas.
Eu acho que provavelmente seja verdade que o O-Sensei não ensinava com armas no Hombu Dojo. Isso pode ter acontecido porque ele não tinha muito tempo para treinar lá. Quando ele estava em Iwama, ele tinha bastante tempo para fazer coisas desse tipo, e nós que estávamos lá realmente fomos ensinados com armas como o ken e jo. Então, o que o Sensei Saito diz é correto, e também o é o comentário de que o O-Sensei se zangava se alguém praticava com armas no Hombu Dojo. De fato, eu mesmo vi o O-Sensei ficar zangado, mas isso foi porque as pessoas que estavam praticando se enfrentar com as espadas (kumitachi) não sabiam nem treinar o básico com as espadas (suburi) muito bem ainda. Eu acho que o O-Sensei sentia que se os alunos iam praticar com espadas, eles deveriam fazê-lo corretamente, e se zangava se os via somente balançando suas espadas, como se estivessem em algum filme de samurai.
Uma vez, numa demonstração com o Sensei Saito --- acho que eu era sandan na época --- eu pedi ao O-Sensei se eu poderia usar uma lâmina real na demonstração de tantotori, mas ele rejeitou a idéia. Acho que ele tinha uma boa idéia de minha real habilidade na época, e sabia que não seria uma boa idéia. Um tempo mais tarde eu usei uma lâmina real numa demonstração em que o O-Sensei não pode comparecer e, é claro que acabei me machucando. Me senti um tolo, e percebi que eu tive que me machucar para perceber porque ele negou meu pedido na primeira vez.
Existem pessoas que praticam outras artes marciais juntamente com o Aikido, por exemplo, misturam com iaido ekarate. Alguns estudam karate para aprender maneiras de se lidar com os socos e chutes, enquanto que outros fazemkendo para aprender mais sobre os cortes e ataques.
Eu acho que isso não tem problema até certo ponto, mas também acho que se você vai longe demais levando isso em seu treinamento, você vai acabar tornando o Aikido em uma luta qualquer. No final, o que irá acontecer, é que irá se tornar uma atitude de desafiar outras formas de Budo, pensando somente em como ser o melhor em cada um ou como vencer aos outros.
Eu acho que é mais importante se lembrar do conselho do O-Sensei para "vencer antes de a luta começar". Ele ficou conhecido por dizer que "nem as bombas atômicas me aterrorizam", baseado no pensamento de que você simplesmente deve em primeiro lugar, evitar que seu oponente as jogue, que é o que é mais importante. Essa falta de medo não vem de se saber o poder de retaliação dos outros num conflito, mas sim de uma orientação espiritual que leva você a soluções que evitam conflitos, em primeiro lugar. As armas são desnecessárias em locais onde não existe conflito, e nem você vai ser atacado em um lugar assim. O-Sensei dizia, "Nosso treinamento diário é uma verdadeira batalha". Ele também dizia, "Nunca tema outros estilos (ryuha), não importa o quanto seja grande ou bom; mas também nunca despreze ou ignore outro estilo, não importa o quanto seja pequeno". E também, "O Aikido tem suas próprias coisas boas, e existem coisas boas em outros estilos também".
É verdade que, após a guerra, a maioria das pessoas que ensinavam Aikido, incluindo o O-Sensei, pararam de ensinar armas, mas eu acho que o assunto importante é tentar ver como o próprio O-Sensei avaliava e entendia sobre a prática com armas.
Eu acho que ele provavelmente sentiu que havia uma necessidade das técnicas com armas. É por isso que ele se juntou a Kashima Shinto-ryu e estudou outros estilos também. Isso nada mais é do que minha própria opinião, mas eu acho que o O-Sensei tinha as armas como um elemento essencial do Aikido, se for para ser praticado como um Budo.
Na verdade, no passado, quando as pessoas pensavam em Budo, elas tendiam a pensar nele como Budo "composto" ou "compreendido" (sogo Budo), que naturalmente incluiria o estudo de armas.
Sim, mas também é importante que nós pensemos sobre como entendemos o propósito de nosso treinamento. Se seu treinamento almeja somente ficar forte no nível superficial, as armas se tornam meros objetos para matar. Eu acho que é muito mais importante, se você está usando uma espada ou jo ou outra coisa, que você siga em seu treinamento de maneira a ajudar a você mesmo como pessoa e cultivar um senso de humanidade melhor. Em outras palavras, as metas de seu treinamento são assuntos mais importantes quando se leva em consideração o papel das armas.
Para o O-Sensei, a meta parecia ser usar as armas como um canalizador ou condutor, através do qual ele buscaria a energia do Universo. Eu acho que esse tipo de coisa foi uma parte importante em como ele usava as armas.
Ele sempre fazia um exercício chamado nijuhappogiri (cortar vinte e oito vezes) na qual ele cortava sete vezes em cada uma das quatro direções, como uma maneira de dispersar a fraqueza e o mal (jaki) pelo espaço à sua volta e também cortar tal fraqueza de seu próprio coração e espírito. Eu acho que é bom se balançar a espada se você está fazendo com esse sentido.
Em seus últimos anos, o O-Sensei parecia estar "possuído" por uma divindade (kami). Por exemplo, ele é conhecido por dizer aos alunos que, quando ele reprimia alguém, dizia que "esse não é o Ueshiba que está reprimindo você, é o Kami!"
Sim, eu sempre ouvia isso, mas eu acho que o que ele queria dizer, é que ele pessoalmente não estava chamando a atenção do aluno por raiva, mas que ao invés disso, ele chamava sua atenção num ponto de vista mais amplo ---- o "grande olho" se você preferir ---- do Kamissama, de maneira a ajudá-lo a crescer. Nesse sentido, não estou certo que seria correto dizer que ele estava "possuído pelos Deuses"; eram mais as pessoas que estavam ao redor dele que interpretavam seus atos daquela maneira. Isso é o que eu acho.
Outra coisa que eu mencionaria da grandeza do O-Sensei, é que, enquanto ele era um ardente seguidor da fé Omoto, ele nunca disse para que seus alunos que deveria se tornar seguidores também. Isso mostra como era o seu verdadeiro calibre. Praticantes de Budo nos velhos tempos, eram pessoas que não estudavam uma só coisa, mas muitas. O próprio O-Sensei sentia que sua missão em vida seria montar seu estilo sem igual de arte marcial, assim, naturalmente ele era muito entusiasmado para estudar as coisas.
É impossível de se criar alguma coisa nova sem que se esteja muito inspirado, não é?
Existiram várias tentativas para se criar um novo tipo de Budo após a guerra, mas a maioria delas não durou mais do que uma geração após sua fundação. Existem pouquíssimos que se mantiveram firme como o Aikido se manteve. Mesmo o Judo que hoje temos, é completamente diferente do que o que foi deixado por seu fundador, Jigoro Kano.
Eu acho que é difícil de se compreender profundamente a originalidade do O-Sensei sem estudar a base fundamental dos seus estudos, particularmente o Budo que ele aprendeu e seu envolvimento com a religião Omoto.
Sim, não importa o quão superficial você se aproxima. Por exemplo, nós tendemos a imaginar que o O-Sensei se envolveu na religião Omoto porque ele sentiu atraído a ela devido a ter atingido o ápice em seu treinamento de Dayto-Ryu Aikijujutsu, mas essa idéia é muito mais simples do que eu realmente acho que foi, mas na realidade tudo foi muito mais profundo. Eu acho que o Aikido é uma peça da cultura tradicional, na forma de Budo, que vale a pena ser passado para as futuras gerações. E porque o que é valioso nele é a sua espiritualidade inerente, seria um erro limitar nosso treinamento somente nos aspectos técnicos. É importante treinar de maneira a se levar em conta o lado espiritual e técnico em conjunto.



Aprender se machucando
Eu soube que o senhor se machucou há alguns anos atrás.
É verdade, foi tanto que eu fiquei sem poder me mover. Eu tive um problema no joelho, mas ignorei e, ao forçá-lo demais, acabei lesionando também minhas costas.
Se reabilitar depois de uma lesão como essa deve ter sido muito difícil sem uma enorme força de vontade.
Havia um famoso especialista em joelhos no Tokio Women's Medical College perto do Hombu Dojo que me disse que eu provavelmente não me recuperaria, e que a única coisa que eu poderia fazer era mexer minhas costas o mínimo possível para evitar que a lesão piorasse. Eu acreditei no que ele me disse e fiz o que pude para evitar mexer essa parte de meu corpo, mas gradualmente essa condição piorou e, por eu não estar usando essa parte, uma de minhas pernas ficou mais fraca e mais fina. Eu não conseguia nem chegar ao banheiro sem uma bengala.
Depois de continuar assim por uns dois anos, comecei a pensar que se eu continuasse a seguir as ordens médicas eu não acabaria completamente desabilitado. Foi aí que decidi que eu deveria assumir as coisas eu mesmo, e começar a trabalhar de outras maneiras para me curar, incluindo achar modos de colocar pesos nos músculos para ajudar a construí-los novamente. Eu me mantive nesse processo repetitivo durante dois anos. Eu acreditei em mim mesmo e em minha capacidade de recuperação de meu corpo se alto-curando.
O senhor ainda continua fazendo algum exercício especial?
Sim, porque eu sei que tudo se acabará se um dia eu não tiver mais nada para fazer. O Aikido é a mesma coisa, na verdade; se você atinge um ponto em que está satisfeito com o que já fez, onde você pensa que ninguém poderá ultrapassá-lo, e aí que você para de progredir. O-Sensei sempre dizia que "Treinar (Shugyo) continua até o dia em que você morre." Acho que essa é uma atitude importante a ser tomada, e que pode ser aplicada em qualquer coisa.
Também é importante perceber que, por exemplo, não importa o quanto famoso ou bem conhecido o médico seja, ele não tem a experiência pessoal sua condição de doente, por isso não sabe tudo sobre a doença, não compreende a natureza real da dor. É por essa razão que, de fato, assim que eu melhorei um pouco e consegui andar um pouco mais, eu gostaria de usar minha experiência para ajudar as pessoas que estão passando pelo mesmo tipo de dor.
International Aikido Federation
Durante a era do falecido Doshu Kisshomaru Ueshiba, o Aikido foi amplamente disseminado fora do Japão, e foi há vinte e três anos atrás que a International Aikido Federation (Federação Internacional de Aikido) foi criada. Eu sei que o senhor foi um dos que esteve ativo nisso, por isso gostaria que nos passasse os sentimentos sobre o assunto e sobre a importância dessa organização.
Eu acho que o Japão demonstra não ter o mínimo interesse na IAF, quando deveria ser o país a Ter maior interesse. Uma razão pode ser que somos muito abençoados com o Aikido em nosso país, com isso eu quero dizer que você pode treinar Aikido sem ter que fazer muito esforço para entrar tal federação. Pode ser por sermos pretensiosos nesse aspecto. No entanto, o que devemos nos lembrar é que existem muitos países no mundo, onde as pessoas não tem acesso tão fácil a professores de Aikido e a locais de treinamento. Eu penso que nossa meta número um deveria ser construir uma organização de maneira que ele possa suprir as necessidades dessas pessoas para treinar Aikido, sem que se gaste muito dinheiro.
A organização do Aikido no Japão é muito vertical, com o Zaidan Hojin Aikikai e o Doshu no topo, e depois os vários shihan no próximo degrau abaixo. A IAF, por outro lado, é organizada mais horizontalmente, num modelo mais democrático. Conseguir com que os dois se integrem bem, deve apresentar algumas sutis dificuldades de tempo em tempo.
É verdade. Devido a organização Japonesa ser fortemente vertical, o modo de pensar tende a ser completamente diferente. No Japão parece existir alguns grandes professores que são confiantes e independentes e pensam que podem se manter praticando sem que tenham que se tornar membros de tal organização. Isso seria normal se fosse só no Japão, mas dada a natureza internacional do Aikido, eu penso que há uma necessidade de se fortalecer gradativamente o papel do que é hoje uma organização fraca, para que se tenha um lugar para atividades que possam contribuir com a compreensão do Aikido entre as pessoas que o praticam pelo mundo inteiro. Não há razão e nada para ganhar se somente o número de praticantes de Aikido aumenta enquanto nós deixamos a compreensão do lado espiritual do Aikido se enfraquecer cada vez mais. Se deixarmos isso acontecer, o Aikido se tornará algo muito diferente do que o O-Sensei tinha em sua visão. O que precisamos não é uma organização que restringirá ações individuais através de uma estrutura hierárquica ou outra qualquer, mas pelo contrário, uma que promova relacionamentos de amizade mútua entre seus membros.
Quanto mais o Aikido se difunde maior será o número de grupos que existirá e que terá que ser associado a ela. Agora mesmo a organização que tem o maior envolvimento é o World Games (Jogos Mundiais), um evento atlético que acontece a cada quatro anos para várias atividades olímpicas, que não é incluído nos Jogos Olímpicos (Olimpíadas), organizado pelo GAISF, iniciado em 1985. Existem várias categorias para os membros da World Games, e já que não seria bom que o próprio Aikikai se tornasse membro dele, a IAF se tornou.
Se você está falando somente sobre Aikido, então é verdade que existe pouca necessidade para organizações extras se colocarem entre o dojo e o contato direto com o Hombu Dojo. Mas, pensando sobre as coisa que acabei de mencionar, talvez tal organização realmente seja necessária.
Especialmente na Europa, onde há maior tendência de o Governo se envolver.
Sim, na França é assim. Por exemplo, somente indivíduos reconhecidos pelo governo Francês estão autorizados a graduar dankyu.
As coisas parecem tomar um certo teor político em tais casos.
Isso essencialmente, não tem nada a ver com o Aikido, já que o Aikido não tem competições e é claramente diferente dos outros vários esportes. No entanto, se você começar a enfatizar o fato de que o Aikido é diferente, ele se tornará isolado, e assim parará de crescer e, finalmente começará a se decompor.
Minha idéia seria ter alunos estrangeiros de Aikido vindo ao Japão para passar de dois a cinco anos no Hombu Dojo, praticando e aprendendo Japonês, e em seguida despachá-los para ensinar em vários dojos locais (como acontece com muitos instrutores japoneses), e depois de uns oito anos no Japão, fazê-los retornar a seus países de origem. Isso lhes daria a chance de entender o modo de pensar do Hombu Dojo, seus objetivos, e maneira de fazer as coisas, e também fazê-los se tornar pontes sobre a barreira da língua estrangeira, quando retornassem para casa. De uma perspectiva internacional, se existissem tais pessoas, seria mais fácil de as pessoas colocarem sua confiança no lado Japonês e as coisas correriam mais levemente nos vários países onde o Aikido é praticado. Hoje em dia as barreiras da língua e cultura são consideráveis.
Nenhum dos não-japoneses atualmente praticando no Hombu Dojo são ushi-deshi, mas moram fora e tem que pegar condução para ir ao dojo (exceto para aqueles que treinam com Sensei Saito em Iwama, onde ainda existe o real sistema de ushi-deshi). Em parte isso pode parecer simples, porque o Hombu Dojo é precário e não tem acomodações. Seria ideal que houvesse mais empenho do Hombu Dojo para ampliar e melhorar as acomodações lá, para que assim as pessoas que vem de outros países para treinar Aikido possam viver mais barato.
É relativamente fácil de se dirigir um dojo como um professor de Aikido profissional estrangeiro, por isso temos que criar um sistema que possa ajudar a cultivar as pessoas que querem fazer isso; senão correremos o risco de sermos ultrapassados no tempo.
A chave parece ser fortalecer o relacionamento entre o Hombu Dojo e as pessoas de outros países, especialmente porque, já que a Europa, olhando de uma perspectiva organizacional, será dominante devido a suas habilidades políticas. Cultivar as pessoas e os recursos humanos é muito importante.
Eu me lembro de ter lido em algum lugar e há muito tempo atrás, a idéia de que "a comunicação é o controle", e que quem dominar a comunicação, dominará tudo. Nesse sentido, eu imagino que, se despacharmos informações do Hombu Dojo diretamente a outros dojos por todo o mundo, sem ter que passar pelo filtro das várias organizações, ajudaria a fortalecer o Hombu Dojo organizacionalmente.
Uma linhagem inquebrável
Agora que nós chegamos a terceira geração de Doshu, quais são seus pensamentos sobre a sucessão no Aikido, na linhagem do sistema Iemoto?
Diferentes pessoa tem pontos de vista diferentes sobre isso, por isso é difícil de se generalizar. Isso pode ser um modo de pensar Japonês, mas há um esforço para se manter a linhagem inquebrável, para manter e proteger algo que serve como um ponto central. O sistema iemoto é uma coisa que existe em todos os tipos de tradições Japonesas, desde a cerimônia do chá., até o teatro Kabuki, e representa a transmissão das coisa por um caminho único e consistente. E, já que o Budo também é um caminho, eu acho que termos esse tipo de sistema, pode ser muito importante para sua transmissão.
Também, existem aqueles que vêm o Aikido como um sistema de combate e sentem que, por essa razão, ele deveria ser sucedido por alguém que seja tecnicamente mais forte. Mas, ser mais forte tecnicamente não é tudo para se ser um sucessor de uma tradição como o Aikido. O sucessor também tem que ter um pensamento sólido e claro, e mesmo que ele seja relativamente jovem, ele deve estar apto para servir como um centro forte e vigiar fortemente com uma visão clara de seu ponto vantajoso que é o topo. Ele também tem ser capaz de ensinar eficientemente. Essas qualidades são muito importantes, porque se o centro se torna abalado, toda a tradição se abala. Pessoas como eu e outros que foram estudantes originais do O-Sensei, sentimos que nossa função e obrigação, tanto para o Fundador quanto para o Segundo Doshu, de darmos e fazermos o melhor que pudermos para apoiar esse Terceiro Doshu, para que assim ele possa fazer seu papel suavemente.
Quais são seus pensamentos quanto a contribuição feita pelo Segundo Doshu, Kisshomaru Ueshiba, ao Aikido?
Perdoem-me por cair numa expressão que sempre é usada mas, como muitos outros diriam, o O-Sensei foi quem foi o pioneiro e criou o Aikido e Kisshomaru Ueshiba foi quem o espalhou e o promoveu pelo mundo afora. Enquanto o O-Sensei tendia a ensinar somente certos indivíduos selecionados, foi Kisshomaru Sensei quem trabalhou para tornar o Aikido mais amplamente acessível, conhecido, e quem internacionalizou e o organizou. Foi também devido a esses grandes esforços, que ele recebeu a Terceira Ordem do Mérito do governo Japonês. O que é importante agora, é ver que tipo de esforços o Terceiro Doshu irá fazer para consolidar a tradição. O Aikido provavelmente continuará a se espalhar mesmo se não houverem maiores esforços para espalhá-lo, então o assunto agora é como a tradição poderá ser consolidada e como continua a crescer.
Parece que o Aikido sofreu certas mudanças técnicas sob a liderança do falecido Doshu Kisshomaru...
Esse é outro assunto sobre o qual não se pode generalizar. Pois, mesmo o O-Sensei mudou consideravelmente desde o tempo em que era mais jovem até seus últimos anos. Mesmo o Sensei Kisshomaru era bem vigoroso em seus anos de juventude e, somente mais tarde, após sofrer cirurgia, que ele passou a executar movimentos menos extenuantes. Eu mesmo sou desse jeito, minha técnica agora é consideravelmente diferente das técnicas que eu fazia quando era mais jovem. Sempre que faço demonstrações hoje em dia, todos os rapazes com quem pratiquei há tempos atrás, costumam brincar comigo dizendo que me tornei muito mais leve e sutil!! Acho que as mudanças técnicas sob Kisshomaru Ueshiba foram pelo mesmo caminho. O que é mais importante é que você sempre tem que dar se inteiro, fazer o seu melhor e colocar todo seu espírito nisso, seja em seu treinamento diário ou dando alguma demonstração. As diferenças são prováveis de aparecer, dependendo de como você visualiza o Aikido --- se você o vê como Budo, ou um caminho para condicionamento físico e a saudável, ou simplesmente como uma forma de movimento. Naturalmente, em meu dojo, nós seguimos o Aikido de acordo com a minha visão dele.
Uma parte disso, é que eu tenho como meu lema a frase "Aikido prático", na qual quero dizer que penso no Aikido como algo que não é somente praticado no dojo, mas que ele deve ser estendido e usado na vida diária. O que por sua vez, levará a uma atitude de viver cada sai como se ele fosse precioso. O Aikido que é praticado somente no dojo, tende a ser algo que leva a se analisar somente quem é mais ou menos melhor tecnicamente, quem é mais forte ou mais fraco. O que é mais importante é que tipo de pessoa você é e como você age como membro da sociedade. Pois, mesmo que você seja um Yudansha ou seja qual for a graduação, se você não contribuir com alguma coisa para a sociedade, então seu treinamento de Aikido terá pouco significado. Se você não colocar o espírito de harmonia do Aikido em prática em sua vida cotidiana --- seja em seu estudos, com sua família ou em seu trabalho --- então eu acho que você não poderá dizer que está praticando realmente o verdadeiro Aikido.
Para concluir, o que o Aikido significa para o senhor hoje?
Provavelmente o que eu sinto mais prazer quando pratico Aikido é que ele permite a tantas pessoas abrir seus corações e se engajarem em verdadeiras amizades. Eu penso em todos aqueles que se foram antes de mim, e sobre aqueles que ainda são jovens, e penso no quanto tem sido maravilhoso encontrar tantas pessoas e fazer tantas amizades. Eles todos são de caminhos tão diferentes da vida, que aprendi muito com eles. Eu acho que provavelmente é uma das coisas mais importantes que me mantém praticando Aikido. O-Sensei era rodeado por tantas pessoas impressionantes, porque ele mesmo era uma grande pessoa. Dificilmente poderei dizer o mesmo de mim mesmo, acho que ainda tenho muitas falhas, mas tenho a esperança de poder continuar a interagir com muitas pessoas e, através do Aikido, eu terei a oportunidade de melhorar a mim mesmo pouco a pouco. Também espero que meus esforços possam ajudar o maior número de pessoas possível vir a compreender a bondade do Aikido, e a viver mais feliz devido a isso. Assim, eu penso, é uma maneira de pagar meu débito de gratidão que devo ao O-Sensei e a Kisshomaru Ueshiba.



fonte:  http://www.aikikai.org.br/site.php?pagina=lista_artigos.php?categoria=5