segunda-feira, 4 de junho de 2012

Budô: o segredo da filosofia oriental

Conta-se na mitologia japonesa que existe um demônio repressor, chamado Shoki, que age de maneira muito dinâmica, pronto para subverter um oponente. Há também um duende das águas, o Kappa, que assume uma posição natural e descontraída. Assim que surge uma oportunidade na defesa do adversário, o Kappa entra em ação. Essa capacidade de assumir as duas posturas, ataque e defesa, de acordo com as circunstâncias pode ser chamada, atualmente, de Budô, filosofia que inspirou todas as artes marciais japonesas atuais, como Aikidô, Judô, Jukendô, Karatê, Kendô, Kyudô, Naguinata, Shorinji-kempo e Sumô. Formada pelos ideogramas “bu”, que significa “guerreiro”, e “do”, que significa “caminho”, essa filosofia tem forte influência do zen-budismo, uma vez que estipula como meta final a iluminação do ser.
Portanto, pode-se dizer que a prática do Budô vai muito além das lutas nos tatami. Ela é a bússola para o caminho espiritual do budoka, praticantes dessa arte. Aos olhos de todas as artes marciais japonesas modernas, o Budô é compreendido como a relação entre a ética e a cultura japonesas. Não desanimar diante das adversidades, mas sim aprender com os desafios, ser disciplinado e respeitar o oponente são alguns dos ensinamentos do Budô.

Os grandes budokas dizem que é com o espírito em harmonia que a pessoa criará uma percepção para agir com energia e coragem a diversas situações que a vida lhe apresentar. “A missão do Budô é fazer com que cada praticante, por meio das boas maneiras, se torne um cidadão melhor para a sociedade”, acredita Fuminori Nakiri, 51, presidente do Budo Gakkai, instituição japonesa que pesquisa essa filosofia.
Pensando assim, não só um praticante de artes marciais, como qualquer pessoa pode utilizar os ensinamentos do Budô para controlar suas emoções e impulsos, tornando-se assim, um verdadeiro guerreiro iluminado.

História
O Budô foi uma derivação do antigo bujutsu, conjunto de disciplinas que eram colocadas em prática nas batalhas durante o período Sengoku-jidai, que durou cerca de 150 anos, entre a metade do século 15 e início do século 17. “No Sengoku-jidai, os samurais lutavam por sobrevivência. As técnicas começaram a ser valorizadas só no Período Edo”, explica Masaru Kanzaki, mestre de Kobudo, a arte dos samurais, a mais antiga arte marcial japonesa.
Ao contrário do conturbado período de guerras do Sengoku-jidai, o período Edo (1603 - 1867), também conhecido como Período Tokugawa, foi marcado pela paz no arquipélago. Com o fim das guerras, as técnicas de lutas que os guerreiros travavam foram ensinadas às pessoas comuns. Criou-se, então, um código oral em que o “espírito da esgrima” (ken-no-kokoro), considerado a base do Bushidô (caminho do samurai), foi transmitido para os praticantes. E como não havia um inimigo, as lutas ganharam características de competição. Para que o caráter competitivo não tomasse conta dos treinamentos, o Budô foi introduzido para ser o caminho espiritual por meio do qual o praticante das lutas de artes marciais atingiria a iluminação. Pode-se então dizer que os objetivos do Budô estão intimamente ligados ao objetivo definitivo da filosofia Zen, que consiste na eliminação do ego, dos preconceitos e ilusões criadas pela mente humana, apegada aos prazeres da Terra.
Durante o Período Edo, surgiram centenas de escolas e modalidades de bujutsu (práticas de combate) com diferentes técnicas, definições e métodos. Essas novas lutas se caracterizaram nas atuais artes marciais japonesas que tem como fonte principal o Budô.
Quem bebeu dessa fonte e se tornou um dos símbolos do ideal budoka foi o samurai Miyamoto Musashi. Depois de muitas lutas vencidas, o guerreiro percebeu que o objetivo das artes marciais ia além da técnica e da aniquilação do adversário. É, então que ele entende a filosofia do Budô.
Assim como a técnica requer prática, para um budoka atingir suas metas, ele precisa praticar incessantemente as premissas do Budô. Aliada à prática, o estudo teórico também é importante para atingir a serenidade diante das situações complicadas da vida.
O que um guerreiro deve seguir
A fim de conservar os princípios básicos do Budô, a Associação Japonesa de Budô decidiu escrever, em 1987, uma Carta do Budô, em que estabelece alguns ‘mandamentos’ para a prática:

1. Por meio do treino mental e físico é possível formar o caráter do budoka, de modo a tornar um indivíduo disciplinado e de bem;
2. Agir com cortesia e respeito durante o treino e desenvolver o equilíbrio entre o corpo, a mente e a técnica. Evitar a tentação de perseguir apenas a técnica de luta corporal;
3. Ter a humildade e autocontrole durante uma competição ou formas definidas de combate (kata);
4. Demonstrar respeito e cortesia no dojô;
5. Os professores devem encorajar a evolução dos seus alunos e não devem dar ênfase somente às competições ou habilidade técnica;
6. As pessoas que promovem o Budô devem ter mente aberta para compreender os valores tradicionais japoneses. Elas devem desenvolver pesquisas e metodologias de ensino para a sua divulgação;
7. Não importa quão rápido seja o movimento, este deve emanar de uma essência calma e silenciosa;
8. A adversidade não faz esmorecer um praticante do budô, ajuda-o a florescer;

O que o guerreiro deve evitar
- insolência
- confiança excessiva
- ganância
- raiva
- medo
- dúvida
- suspeita
- hesitação
- desprezo
- vaidade

Os dez males aos quais um budoka não deve se entregar, segundo um manuscrito da Escola de Kashima Shin (retirado do livro Segredos do Budô, organizado por John Stevens. Editora Cultrix, 11ª edição)

fonte: http://madeinjapan.uol.com.br/2010/12/22/budo-o-segredo-da-filosofia-oriental/

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